Festival Novas Frequências 10 anos divulga as atrações. Chico Dub nos conta sobre a curadoria
Chico Dub nos conta o passado, o presente e o futuro do festival Novas Frequências em série de 10 episódios celebrando a décima edição do festival.
Depois de um resumão histórico sobre o festival dividido em duas partes e do meu texto de curadoria, faço agora uma nova proposta: dissecar as 43 atrações do Novas Frequências em mini-blocos temáticos. Vou fazer em 2 partes também, pra dar tempo de digerir. E aí, bora lá?
Mesmo contando pela primeira vez em toda a sua história com um line-up 100% nacional, parte da programação, ainda assim, traça pontes com outras cenas e geografias convidando (também) artistas brasileiros residentes no exterior. Thessia Machado é artista visual/sonora, construtora de instrumentos e performer residente em Nova Iorque. Baseada em Tel Aviv, Maya Dikstein investiga o espaço como um lugar praticado e sua construção através de movimentos e usos. Vivendo em Havana, Renata Roman transita entre instalação, música experimental, arte radiofônica e paisagens sonoras. Radicada em Viena, Luiza Schulz Vasquez desenvolveu para o festival um trabalho em parceria com Celina Kuschnir, atualmente morando em Buenos Aires, onde as duas, em comunhão com o Quinteto de Cordas da Camerata de Laranjeiras, refletem sobre as mudanças climáticas em contexto de aquecimento global. Ambos em Berlim, Manuel Pessôa de Lima e Lola Lustosa criaram um podcast sobre a própria 10ª edição do Novas Frequências, um misto de programa educativo, talk show humorístico e espaço de reflexão sobre a cena de música experimental. Em peça inédita para o Novas Frequências, Marcela Lucatelli, moradora de Copenhagen, apresenta uma leitura performática de trechos do livro A Verdade Seduzida, do jornalista, sociólogo e pesquisador Muniz Sodré, obra que traça um panorama dos processos de cultura hegemônica e como isso foi assimilado pela comunidade negra no Brasil.
Depois das participações no ano passado de Beatriz Ferreyra e Èliane Radigue, duas das principais pioneiras da música eletroacústica em todo mundo, chegou a vez do Novas Frequências finalmente receber Jocy de Oliveira, o grande destaque desta 10ª edição. Pianista, compositora, precursora no Brasil em obras multimídia e a primeira mulher a ter uma ópera encenada no Theatro Municipal de São Paulo, a artista, com 84 anos, ganha uma releitura imagética com assinatura da artista visual e radiofônica Lilian Zaremba de duas de suas peças para voz e eletroacústica, – La Loba e Naked Diva – respectivamente de 1995 e 1998 -, regravadas especialmente para o Novas Frequências no estúdio do LabSonica, o laboratório de experimentação sonora e musical do Oi Futuro.
O flerte do festival com outras linguagens artísticas, para além da música, é outro ponto alto da 10ª edição. Romancista e cineasta, João Paulo Cuenca vem realizando vídeos na quarentena baseados em entradas de um diário. Para o Novas Frequências, ele intensifica a experiência em uma peça audiovisual composta em parceria com o músico e compositor Barulhista. Doutrinada em templos batistas, a cantora evangelista, escritora, compositora e artista visual Ventura Profana tem seu corpo sonorizado, através de microfones de contato, pelo produtor musical e DJ Podeserdesligado. A dupla de artistas performers Irmãs Brasil projeta narrativas de diversas partes do mundo onde os direitos humanos são violados. Artista multimídia com passagens pela Bienal do Mercosul e Bienal de São Paulo Thiago Rocha Pitta desenvolve, junto ao artista sonoro Paulo Dantas, um vídeo a partir de Abismo sobre Abismo, obra que avança sobre vista para precipício na cidade de Petrópolis. Um dos nomes mais incensados do teatro e cinema nacional nos últimos anos, Grace Passô cria uma imaginação sonora da peça radiofônica Para acabar com o julgamento de Deus, de Antonin Artaud, em parceria com os convidados Thelmo Cristovam, Maurício Badé e Barulhista. Mergulhada na noção de não-lugar de experiências diaspóricas, Ficções Sônicas, título do trabalho de Grace, é uma coprodução com a Fundação Bienal e integra a rede de parcerias da 34ª Bienal de São Paulo – Faz escuro mas eu canto. A obra nasce com a 10ª edição do festival e se re-configura como instalação sonora em setembro de 2021.
Outra parceria desta edição se dá com a Veneno, rádio e plataforma digital criada em em São Paulo, em 2018, que traz 6 de seus artistas residentes para criarem duplas e estimularem o diálogo entre as diferentes linguagens trabalhadas por cada um: Acaptcha x DESAMPA, Carla Boregas x Akin, ERAM x EPX.
Com a programação recheada de artistas ligados ao Rio de Janeiro – ainda que muitos estejam ou vivendo em outras localidades, ou sejam residentes, porém naturais de outros Estados – três deles se configuram como importantes destaques da cena. Comumente associados a uma estética tropicalista e sonoridade no wave, Thiago Nassif e Negro Leo produziram trabalhos que de alguma forma se associam ao reflexo e ao espelhamento de questões político-sociais. No curta metragem de Leo, dois personagens que são a mesma pessoa conversam entre si e são replicados de forma infinita numa TV desligada. Por outro lado, o trio de música eletrônica apocalíptica Tantão & Os Fita traz uma proposta não-performática, mas desenvolveram um banco de samples em formato de sequenciador eletrônico onde o público pode compor batidas utilizando trechos do recém lançado álbum Piorou.
Desde 2015, o Novas Frequências se aprofunda em obras de arte sonora, trabalhos que, em geral, desenvolvem outras relações do som com o espaço. Dentro desse contexto, além dos já citados artistas Thessia Machado, Renata Roman e Paulo Dantas, está O Grivo, dupla mineira que cria percursos sonoros que são, além de uma nova maneira de ouvir, uma nova maneira de ver os mecanismos de produção do som. Para o festival, prepararam um vídeo onde a montagem de uma instalação se configura como a própria obra de arte. Já Paulo Vivacqua exibe alguns de seus desenhos-partituras (da série memo) que tomam corpo e forma na interpretação dos artistas convidados Mariana Carvalho, Didac Tiago e Adriano Motta de acordo com o instrumento de cada um.