Expoente do funk carioca for export, Chernobyl lança por selo alemão

Claudia Assef
Por Claudia Assef
O funkeiro gaúcho Fredi Chernobyl é um dos pais do batidão for export

O funkeiro gaúcho Fredi Chernobyl é um dos pais do batidão for export

Se o funk carioca conseguiu sair dos morros do Rio pra dar “rolés” mundo afora, o guitarrista, produtor musical e DJ Fredi Chernobyl tem uma boa parcela de culpa nisso. E olha que o cara nem carioca é. Chernobyl é guitarrista da Comunidade Nin-Jitsu, banda formada em Porto Alegre em 1995 que, ao lado de Edu K, mostrou que no sul também se faz funk carioca. Só que sulista, ou seja, misturado com rock e samples de música pop.

O primeiro disco da Comunidade Nin-Jitsu saiu no longínquo ano de 98 e de lá pra cá o funk já esteve por cima da carne seca, virou produto de exportação, foi tomado por artistas gringos (especialmente pela cantora M.I.A. e pelo DJ Diplo), ganhou notoriedade através de novos DJs (como Sany Pitbull e Sandrinho) e até conquistou um mercado duro de roer: a periferia de São Paulo, que abriu um espaço para o estilo, quebrando a hegemonia do rap.

Além de ser um dos cabeças da Comunidade, Chernobyl viaja o mundo tocando como DJ e suas produções costumam parar em cases bem ecléticos. Como produtor, ele esteve por trás do sucesso do Bonde do Rolê, outro grupo do sul (Curitiba) que levou a tag funk carioca mundo afora. Resumindo, Chernobyl é tipo o pai deste funk carioca feito por não-cariocas que os gringos tanto adoram – e que, lá fora, chamam de “baile funk”.

Chernobyl está de EP novo na praça. Empina a Pipa, lançado na sexta passada (18/12) em lojas de música digital do mundo todo pelo selo alemão Exploited Records, vem sendo tocado tanto por nomes revelações, como o francês Brodinski, quanto por veteranos, como John Digweed. Em janeiro, o EP sai no formato vinil.

Com remixes de Samin, Renaissance Man, Edu K e João Brasil, o disquinho traz mais da fórmula quente de Chernobyl: letras sacanas, mix de gêneros sobrepostos pelo batidão e um pé forte na pista de dança. Também tem participações legais nos vocais. Em Empina a Pipa, Cabal e MC Gi dividem as vozes, e em Balança, o convidado é o MC cabo-verdiano Praga.

Além do projeto solo e da Comunidade Nin-Jitsu, Chernobyl ainda arruma tempo pra o grupo de electrorock Brollies & Apples (que divide com Bianca e Rodrigo Brandão, da banda Leela, e com a escritora Carol Teixeira).

Antes de ler a entrevista que o Todo DJ Já Sambou fez com o produtor, baixe o remix de Balança, feito pelo Renaissance Man, aqui

TODO DJ JÁ SAMBOU – Você foi o cara que botou o funk carioca na boca do povo do rock e da música eletrônica, mas você nem do Rio é. Conta essa história.

FREDI CHERNOBYL – Isso é estranho. Porque no Rio tinha muita gente com preconceito, achando que ia ser confundido com gente simples, dos bairros mais pobres, e não assumiam o funk de lá. Teve que a Comunidade Nin-Jitsu fazer Detetive em 1995 – e que depois virou um sucesso apenas regional no RS atingindo da classe A à Z – e o Diplo 10 anos depois chegar como uma nave vinda dos EUA pra dizer mais ou menos isso pro povo: “gente moderna, vocês podem gostar de funk, viu? é cool/maneiro”. Porto Alegre é rockeira por isso metemos o hard rock em cima do funk. Costumávamos ir em bailes populares pra cantar o Rap da Felicidade e continuamos amando isso. A nossa turma da Comunidade + friends sempre admirou o Miami bass e o tamborzão, nunca fomos gaúchos fãs dos Beatles nem dos Stones.

TODO DJ JÁ SAMBOU – O funk saiu do Rio e foi dar um rolê pelo mundo. Em que pé está o gênero agora?

FREDI CHERNOBYL – O funk carioca tá rolando de forma mais subliminar (não está tão na cara quanto em 2005/06/07/08). Isto é, nas viradas dos beats ou com algum MC brasileiro em mash-up com algo fidget house, como o Crookers faz e Daniel Haaksman vem fazendo. O batidão cai bem sempre, independente de moda étnica do momento. Acho que os europeus elegem de tempos em tempos qual é o ritmo quente que vai misturar com o frio deles. Agora temos muita coisa tropical batendo na Alemanha, coisas meio afro. Por outro lado, toquei em Moscou e não pude arredar o pé do baile funk. O que ajuda a fazer com que o estilo seja aceito é que desde que comecei a ser DJ faço 80% dos tracks que toco, que são versões em funk carioca de coisas cosmopolitas (electro, rock, rap…). Hoje em dia, graças a Deus, tem mais gente fazendo isso, o que me facilita, pois passo menos trabalho e insiro outras vibes excelentes. Os remixes do meu EP complementam meu baile funk inserindo tudo que tá pegando pelas bandas de lá.

TODO DJ JÁ SAMBOU – O que você acha de gringos como Diplo, M.I.A., Daniel Haaksman, que de uma maneira se apropriaram do funk… é legítimo gringo funkeiro?

FREDI CHERNOBYL – É legítimo sim. O Daniel é praticamente um antropólogo que ama o Brasil (e o Hermano Viana ama ele), e seus tracks são excelentes. O Diplo é um americano empreendedor, não fez pelo funk, fez pra chegar com uma novidade ao mundo e se dar bem – o que é legítimo também porque ajudou a muitos por tabela. E a M.I.A. era namorada dele que foi no bonde. O casal Diplo & Maya tem um amigo brasileiro que ensinou muita coisa a eles, o diretor do filme Favela On Blast, Leandro HBL, um cara muito inteligente, que tinha estudado cinema com o Diplo na Itália.

TODO DJ JÁ SAMBOU – Qual é nova boa do funk na sua opinião?

FREDI CHERNOBYL – Não sei dizer. O funk é livre, tem muitos samples loucos “da hora” que vários copiam de vários. Eu tô gostando de usar sopros de músicas balcânicas, cansei de fazer com rock. Tem uma rádio pirata que pega aqui em Santa Cecília (acho que é 87.7 FM) que toca uns funks com beat quatro por quatro, reto, bem acelerados, e as letras são escrachadas. Adoro. Foi o Dudu Marote que me falou.

TODO DJ JÁ SAMBOU – Esse seu novo EP é bem eclético, tem de Cabal a Samin e vários gêneros diferentes. Qual era a ideia?

FREDI CHERNOBYL – A idéia é mostrar todas as vertentes “calientes” que estão batendo no momento. Tem remixer mexicano (Toy Selectah), alemão (Dex), finlandês (Renaissance Man), Samim (não sei da onde é, mas manja da parada), brasileiro (Edu K e João Brasil)… o Shir Khan, dono do selo, acredita muito em mim. Tocamos juntos em baladas fortes de Berlim, só pro povo mais exigente de lá. Ele tava a fim de lançar um EP meu há mais de um ano.

TODO DJ JÁ SAMBOU – Qual o papel do DJ no funk carioca? Como se formam DJs de funk como Sany Pitbull?

FREDI CHERNOBYL – Acho que, a princípio, é ser um bom DJ de baile. Segurar a massa é algo difícil. O Sany toca seis horas por baile desde 1984. Não é à toa que ele está onde está. Eu adoro ele. É inteligente, criativo, talentoso, amigo e o mais importante: cabeça aberta. É um cara que não acha que o cara precisa ter nascido no RJ pra tocar um bom funk, assim como não precisa ser inglês pra ser bom no rock.

Para ouvir e comprar o EP no Beatport, clique aqui

capa

Claudia Assef

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Autora do único livro escrito no Brasil sobre a história do DJ e da cena eletrônica nacional, a jornalista e DJ Claudia Assef tomou contato com a música de pista ainda criança, por influência dos pais, um casal festeiro que não perdia noitadas nas discotecas que fervilhavam na São Paulo dos anos 70.

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