
Sucesso indie brasileiro, Moptop volta depois de 15 anos: “A gente quer se divertir com os fãs de novo”
Jota Wagner e Flávio Lerner conversam com o frontman Gabriel Marques; grupo carioca lançou single de retorno, anunciou novo álbum e show em SP
Começamos a conversa com Gabriel Marques, refundador do Moptop, sucesso no universo indie brasileiro que acaba de anunciar a volta com novo single e álbum no forno. Marques se mudou para os Estados Unidos quando a banda se dissolveu, no auge do sucesso, mas com um futuro de incertezas, típico de qualquer artista brasileiro querendo sobreviver de música. Quando resolveu parar, o quarteto — formado ainda por Rodrigo Curi (guitarra), Daniel Campos (baixo) e Mario Mamede (bateria) — havia gravado dois álbuns por uma grande gravadora, a Universal Music, e tinha como maior hit, ironicamente, a música chamada O Rock Acabou.
Acabou nada. Depois de 15 anos, o grupo está de volta, com o single Last Time, lançado nesta sexta-feira, 11, um disco pronto para sair — Ghosts está previsto para maio — e um show agendado para o dia 12 de julho, no Augusta Hi-Fi, em São Paulo.
Ao lado de Flávio Lerner, bato um papo com o Gabriel sobre essa história toda. Uma banda que parou no auge, desistiu da música para seguir outros rumos (hoje o cara trabalha para a Amazon Music, nos Estados Unidos) e, de uma hora para outra, “o radinho voltou a tocar dentro da cabeça”.
A angústia ideal para arte voltou ao peito, as composições entraram pela porta e pum, um disco novo do Moptop, adicionando anos de experiência de vida e de sons (a qualidade do single está fora de série) chega para matar a saudade dos fãs e conquistar outros novos. Ghosts sai com letras em inglês, pela primeira vez, já mirando os muitos bares de Los Angeles — e além.
Grande sucesso do Moptop, O Rock Acabou foi lançado em 2006
Jota Wagner: Como anda Los Angeles? Ainda culturamente quente?
Gabriel Marques (Moptop): Cara, tô aqui há quatro anos. Mas é bem intenso aqui. A agenda de shows é diária. Os ingressos acabam muito rápido, então você tem de se planejar. Tem muita coisa rolando.
JW: O que motivou o Moptop a voltar?
Voltou porque as músicas voltaram. É como eu explico para minha esposa: tem um radinho na minha cabeça que, em certa época, tocava música sem parar. Era só pegar o violão, anotar algumas letras e estava pronto. Em algum momento, eu desliguei esse rádio quando decidi que não queria mais fazer isso.
Só que o rádio voltou a tocar. Coincidiu com a compra de um violão bom, que me dei de presente. Até então nunca havia tido um violão decente na minha vida, só vagabundo. Aí as músicas surgiram. O Curi, que ficou no Brasil, me enche o saco todos os anos. Manda mensagens: “vamos tocar com o povo? Tem alguma música?”.

Noel Gallagher, do Oasis, usando a camiseta do Moptop. Banda carioca abriu show do grupo britânico em SP em 2006. Foto: Divulgação
E eu sempre respondia: “esquece isso, cara, eu já parei”. Mas aí, uns dois anos atrás, mandei umas coisas para ele. O Curi sempre foi meu maior fã e meu maior crítico. Ele achou muito maneiro, quis fazer acontecer. Demorou um ano e meio para conseguirmos gravar tudo, produzir, mixar e masterizar.
JW: O single novo de vocês, bem legal, tem um salto de produção gigantesco…
Primeiramente, obrigado. Cara, acho que saiu assim porque a gente fez do nosso jeito. A gente não ficou escutando… Segui meu ouvido e ponto final. Gosto de coisas com energia de banda. Bateria e metais foram gravados em estúdio.. O resto foi em casa, com equipamento bem budget.

Moptop no programa “Altas Horas”, em 2008. Foto: Renan Yudi/Divulgação
JW: Mas colocaram alguém para mixar, masterizar, etc?
Sim. A mixagem, quem deu o levante foi o Daniel Carvalho, amigo de longa data e que já fez Nação Zumbi, Marisa Monte, Los Hermanos… É muito brother, então foi muito fácil a troca com ele. A masterização foi feita em Nova Iorque, com um cara indicado pelo próprio Daniel.
JW: O single é que inspirou em vocês a vontade de um álbum, ou o contrário?
Quando a gente conversou [sobre voltar], eu falei: “só faço se for pra ser um disco”. Não sei por que botei isso na cabeça, acho que sou old school. Escuto disco, não música. Essa é a minha maneira de escutar, sempre foi. Então, o single é pensado para um disco todo. Essa foi uma das primeiras músicas que bateram mesmo. Coincidiu em ser a primeira faixa. Ele está diferente do Moptop. É uma ponte do antigo para o novo. E achamos que essa música era forte, pra cima, que pegava, e simples, em vários sentidos.
Flávio Lerner: Havia muitas comparações de vocês com os Strokes. Era algo que incomodava? Vocês buscam se distanciar desse rótulo?

Moptop abrindo para o Franz Ferdinand, em 2009. Foto: Renan Yudi/Divulgação
Acho que não. A gente tinha noção de que, se não fosse a comparação, a gente não estaria sendo reconhecido, visto. Um dos motivos de destaque foi a comparação. Mas a gente foi se distanciando disso, já no segundo disco. Mas certamente Strokes não foi uma inspiração para o nosso segundo álbum.
JW: Tem um lance meio colonista, de sempre ter de comparar uma banda brasileira com uma gringa, inclusive por nós, da imprensa.
É um simplificador, né? Na época a gente até achava engraçado. Tocava Strokes nos shows. Fizemos um programa na MTV, Cover Nation, como cover dos Strokes, então não nos incomodava não. Tínhamos um leque maior, mas as músicas que pegavam, em nossas primeiras demos, eram as mais strokeanas. Então fomos nessa linha.
Sobre o novo trabalho, a gente botou na cabeça assim: “vamos fazer essas músicas serem o que elas são”. Não vamos ficar pensando muito em estética. No começo, nem sabíamos se ia ser lançado como Moptop. Gravamos para ver o que acontecia. Aos poucos, fomos vendo que era o nosso DNA.
JW: Vocês estavam na crista da onda do indie rock, superabsorvido em grandes festivais. Você acha que o Brasil aproveitou pouco essa onda?
Acho que nossa geração teve o azar de pegar a pior época da indústria da música em todos os tempos: o fim do CD e antes do streaming. Pegamos a era do MP3, mas ninguém queria comprar. Foi um momento de incerteza. Muitas bandas boas não tiveram fôlego para continuar, e nem suporte de uma produção, de gente boa em volta ajudando a elevar a arte. A galera tinha que fazer tudo muito por conta própria. A gente teve gravadora, conseguiu aquele apoio. E mesmo assim eu parei e pensei: cara, não sei se quero fazer isso pelo resto da vida. Não vou conseguir ter uma carreira fazendo isso.
FL: Gabriel, você citou em uma entrevista para o G1 há cinco anos que as longas turnês e “a falta do que falar” foram os principais motivos para o fim da banda. Como estão essas questões agora? Em qual patamar vocês querem chegar?
Sim. O segundo disco deu muito trabalho. Me vi escrevendo letras que pareciam com o que já tinha falado no primeiro disco. Até nos arranjos, me vi repetindo muita coisa. Bateu uma parede artística ali. Também conheci minhas esposa, queria montar uma família. Como fazer isso viajando nessas condições?

Moptop homnageando os 40 anos de “Abbey Road”, dos Beatles, em 2009. Foto: Leonardo Aversa/Agência O Globo/Divulgação
JW: Estabilidade zero…
Exatamente. E eu tinha essa coisa do trabalho com tecnologia. Tinha esse outro caminho. Então tomei a decisão. Agora, onde a gente quer chegar? Essa é uma boa pergunta… Eu diria que tenho um lado sonhador meu. Estou achando que o disco está muito bom, a melhor coisa que a gente já fez. Então, o sonho é abrir portas internacionais.
No Brasil, vejo o rock cada vez menor e está cada vez mais difícil abrir espaço. Mas aqui, cara, vejo bandas de médio porte esgotarem shows em horas. Tudo lotado. Em qualquer lugar está tocando o som que eu curto. Agora, eu também sou realista. Sei que tem muita música boa por aí, muita coisa rolando. A gente não tem mais 20 anos, nem o tempo e o gás que a gente tinha. Eu não sei, cara, mas estou aberto. A gente quer ser divertir com os fãs de novo. Também queremos nos reencontrar.
JW: Vocês tem show agendado no Brasil. Qual o sentimento do reencontro com os fãs?
Eu ainda estou no lance do disco, querendo botá-lo no mundo. Claro que eu já pensei no show, comecei a imaginar como será quando chegar mais próximo e bater aquela ansiedade e empolgação. Mas por enquanto, estou na ansiedade do trabalho em si. Esse disco veio muito do coração. Quero botar ele no mundo e dividir, ver a reação das pessoas, para o bem ou para o mal.
JW: É diferente da pressão que há quando você está com uma banda rodando. Foi mais leve fazer esse disco?
Com certeza. A gente não precisava. Foi uma necessidade da arte, em si. Foi muito legal fazer as coisas assim, mais velho, com mais leveza. Me lembro que ficava muito obcecado com umas besteiras, quando era mais jovem.
FL: Como você agora mora nos Estados Unidos, como vai ser a logística da banda?
Para o Brasil, a gente vai ter de casar shows em épocas estratégicas, normalmente em junho e julho, que é quando dá pra fugir. Tenho liberdade de trabalho, o Cury [que hoje mora na Austrália] também. E se pintar um festival pontual aqui e ali, a gente tenta fazer. Se pintar alguma coisa fora, a gente não tem muita ideia de como fazer. Talvez ter configurações diferentes da banda. Mas isso é algo que a gente vai resolver depois. Para os shows no Brasil, a gente se fala semanalmente. E quando chegarmos aí, vamos ter um tempo de ensaio juntos.