Foto: Max Kneefel

Em Amsterdam, Dekmantel e Gop Tun falam sobre origem da parceria que levou à criação do festival em SP

Claudia Assef
Por Claudia Assef

Em meio à enxurrada de coisas que o Amsterdam Dance Event (ADE) oferece a cada nova edição, fica difícil selecionar aquelas que serão consideradas ou mesmo presenciadas. Na última edição do evento, em outubro passado, algumas presenças brasileiras chamaram atenção especial.

Numa conversa descontraída e esclarecedora com dois dos responsáveis pela primeira versão internacional do Dekmantel, que será realizado em São Paulo nos dias 4 e 5 de fevereiro, estavam presentes Caio Taborda, representando o coletivo brasileiro Gop Tun, e Thomas Martojo, como porta-voz do Dekmantel. Mediado por Femke Dekker, uma sumidade musical local que apresenta o programa Classic Album Sundays, da Red Light Radio, o painel From Amsterdam to the World: Dekmantel Goes Global procurou explicar um pouco de como se deu a parceria que originou o evento.

“Nós sempre quisemos fazer o tipo de festas que gostaríamos de frequentar, acho que esse é um impulso bem comum a todos que se envolvem nesse quinhão”, contextualizou Thomas Martojo. “Eu e Capser Tielrooj, meu parceiro desde o início, começamos nossas atividades há nove anos. Originalmente, nosso evento se chamava Detroit Spirit, o que já denota bastante daquela pretensão que é tão característica da juventude. A primeira edição, por coincidência, foi feita aqui mesmo nessas docas, com Robert Hood como convidado para umas cem pessoas. Depois resolvemos ressaltar nossa herança cultural e usar uma palavra bem holandesa para nos designar, e foi surpreendente o quanto ela foi bem-sucedida e acabou pegando”, resumiu Martojo sobre os primórdios do Dekmantel.

Thomas Martojo, Caio Taborda e Femke Dekker no painel From Amsterdam to the World: Dekmantel Goes Global

Caio contou que a intenção inicial do crew Gop Tun partia de um lugar bem parecido. “O que queríamos era criar o tipo de evento musical que nos agradasse, explorando as sonoridades que gostávamos, com a qualidade de som e cenografia de acordo com o que queríamos. Foi em torno desses objetivos e princípios que meus sócios e eu nos unimos para criar a Gop Tun”, contou.

Ambos contaram que o crescimento das duas marcas se deu de forma orgânica. “Creio ser esse o rumo mais usual do tipo de projeto que criamos: para um nicho específico e centrado numa proposta que não visa resultados comerciais imediatos”, acredita Martojo. “A dinâmica de nosso coletivo foi bem similar. Os eventos foram crescendo natural e constantemente, atraindo um público cada vez maior e mais consonante com nossa proposta. Fomos nos empenhando em criar condições e situações nas quais valores originais não se perdessem e chegamos ao ponto em que estamos atualmente, em que acabamos de realizar uma festa de aniversário de quatro anos para duas mil pessoas”, diz Caio.

A mediadora questionou sobre as mudanças no processo de expansão das duas marcas. Segundo Martojo, a base para um crescimento consolidado é organização e planejamento. “Os resultados não brotam da boa vontade e ambição, eles exigem atenção a detalhes e preparo. Aqui é nosso terceiro membro central, Matthijs Terville, quem cuida de todos esses aspectos, que nos permitem ter toda liberdade para criar o que quisermos do modo que acharmos melhor”, disse. “Quanto à Gop”, respondeu Caio, “nos privilegiamos de um sistema de trabalho colaborativo bem eficiente que fomos criando no decorrer da existência do coletivo. Somos um quinteto de DJs e todos tocamos, portanto era essencial criarmos um método de trabalho equilibrado e eficaz. Dividimos as tarefas e provisionamos os esforços, de modo a otimizar o funcionamento de tudo para que possamos ao menos nos divertir um pouco em nossa própria festa. Como ele disse, planejamento é fundamental”.

Os dois falaram ainda sobre o início da parceria. “Foi realmente uma questão de profunda afinidade em torno de intenções e ideias compartilhados. São Paulo foi uma das etapas de uma longa sequência de showcases que fizemos pelo mundo afora e foi inevitável ficarmos impressionados. Todos os quesitos que tínhamos como centrais estavam presentes ali: o público, a produção, a música, a vibração… Já havíamos feito algo diferente do que fazemos em Amsterdam na ilha de Tisno, na Croácia, o Selectors, uma versão reduzida que se baseou em um dos palcos do Dekmantel”, contou Thomas Martojo.

“Conhecemos o festival há dois anos, quando fomos visitá-lo pela primeira vez e acabamos por conhecer seus realizadores. Testemunhamos que tudo o que faziam tinha muito em comum com o que motivava nossos esforços e acabamos por convidá-los para tocar em uma das Gop Tun, a que fizemos na Praça das Artes, no coração do Centro de São Paulo”, emendou Caio.

“Conversamos entre nós e vislumbramos um plano para realizar a edição paulistana. Entramos em contato com o pessoal da Gop, eles toparam. E aqui estamos. Nunca houve um planejamento propriamente dito, em termos de levar o que fazemos no Amsterdamse Bos [os bosques nas franjas da cidade nos quais realizam o Dekmantel] para outras localidades, já que nunca pensamos em criar franquias como outros festivais maiores. O que aconteceu foi apenas a visão de uma oportunidade junto a parceiros com os quais encontramos uma enorme compatibilidade. Pense numa família estendida, é essa a imagem que temos deste projeto”, completou o holandês.

Gop Tun no QG do Dekmantel em Amsterdam

“A coordenação de algo deste escopo exige muito diálogo e uma confiança mútuas que surgem de uma relação bem duradoura, mas no nosso caso isso se cristalizou de maneira bem espontânea. E, obviamente, tanto um como outro possuem alguma experiência nesse mercado”, disse Caio.

Thomas Martojo falou ainda sobre a locação escolhida em São Paulo: “As estruturas do Jockey Club e da Fabriketa são algo fenomenal e que vão se somar ao conteúdo musical, criando o tipo de experiência que entendemos como distintivo do que é o Dekmantel”.

Em seguida, algumas perguntas da plateia se centraram nas virtualidades da parceria e de como ela se daria num cenário de possível saturação do mercado de festivais, além da relevância de se ter uma marca visual e conceitualmente forte para desbravar novos territórios. A resposta de ambos foi uníssona no otimismo:
“Acredito que a força conceitual e visual do Dekmantel são o cerne de nossa confiança e há um imenso potencial de gerar algo novo em âmbito internacional. Nossa posição aqui na Holanda já era confortável, então pudemos nos arriscar de um modo controlado em uma outra realidade”, disse Martojo. “Mesmo face a uma crise econômica ou uma estagnação do mercado como foi citado aqui, a reação que tivemos do público regional aponta para uma realidade muito auspiciosa para todos nós”, completou Caio.

Sobre o papel transformador que algo como o Dekmantel Festival São Paulo teria para a cena local, ambos foram taxativos: “Nossa função não é educar o público, isso tende a não funcionar muito bem, mesmo no longo prazo. Creio que as nossas intenções são sinceras, nossa missão de levar boa música a pessoas que queiram ouvi-la permanece pura de coração e isso se reflete em qualquer lugar ao qual a levamos”, respondeu o holandês. Caio concordou: “é o que fizemos desde nossas origens, seja com artistas nacionais ou internacionais, agora apenas temos uma chance de intensificar nossas ações e, talvez, mudar muita coisa para melhor”. Já estamos contando os minutos para os dias 4 e 5 de fevereiro.

Dekmantel Festival São Paulo 2017
Sábado e domingo, 4 e 5/2
Joquey Club (Day) e Fabriqueta
Preços: de R$ 90 a R$ 400
Link para compra de ingressos aqui

Claudia Assef

https://www.musicnonstop.com.br

Autora do único livro escrito no Brasil sobre a história do DJ e da cena eletrônica nacional, a jornalista e DJ Claudia Assef tomou contato com a música de pista ainda criança, por influência dos pais, um casal festeiro que não perdia noitadas nas discotecas que fervilhavam na São Paulo dos anos 70.

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