Iggy Pop no palco Iggy Pop – foto: divulgação

Desencafonando o rock. Dez especialistas indicam bandas que mantém o espírito revolucionário do rock´n´roll

Jota Wagner
Por Jota Wagner

O bom e velho rock’n’roll, pedra angular da contra-cultura e da revolução de toda uma geração em relação a costumes conservadores, continua mais vivo do que nunca, apesar do que pensa muita gente por aí.

Quando Roger Waters, fundador da banda absurdamente politizada Pink Floyd, se manifestou em seus shows no Brasil em 2018 contra a onda conversadora que toma conta do país,  testemunhou verdadeiros calafrios (e vaias) em muita gente que estava no estádio e, fora dele também, ao se surpreender com a posição política do cantor. Argumentou-se que não se deve misturar política e rock’n’roll !!!

Não é justo dizer que Waters se surpreendeu.  O cantor já estava acostumado com a onda conservadora que assolava o mundo, com partidos de ultra direita quase vencendo eleições em países que inclusive ainda sentem na pele as dores das feridas causadas por alucinações políticas coletivas, como o caso da Alemanha e da Itália.

E o que deve dar úlceras no velho Waters certamente é a pergunta:  como diabos este povo um dia conseguiu ser fã de Pink Floyd?

Deixamos as explicações de tamanha miopia para os especialistas.  O rock´n´roll ganhou imensa força graças à primeira geração de jovens que tinha seu próprio dinheiro para gastar. Trabalhavam a semana toda e corriam ávidos às lojas de discos para patrocinar artistas que apresentavam uma visão de vida completamente diferente da seus pais. No pós guerra americano, viver (isso incluía festar, transar, experimentar)  era muito mais importante do que casar, comprar uma casa financiada e fazer filhos. Afinal,  vai que um líder sanguinário e ditador volta para aprisionar o pensamento humano novamente, como previa Aldous Huxley e George Orwell?

E então veio o sexualizado Elvis, veio Mick Jagger, veio Pete Townshend avisando que preferia “morrer  à ficar velho” (intelectualmente, é claro), vieram os Beatles em sua fase existencialista… veio tanta coisa para carimbar o original e imutável espírito do rock´n´roll: a ojeriza à repressão de costumes.

Tem gente, no entanto, que trabalha duro para encafonar o rock e fazer com que o estilo esteja atrelado à reacionários entristecidos com a vida. Parte do trabalho, por incrível que pareça, executado por próprios ex-rockstars arrependidos da vida que levavam. Caso de nomes como John Lydon (Sex Pistols!!), Ian Brown (dos Stone Roses), os irmãos Gallagher (Oasis) e Morrisey (dos Smiths), só para citar os mais surpreendentes.

O Music Non Stop não abandonará o rock´n´roll às mãos erradas. O bom e novo está por aí, com artistas e bandas que mantém seu espírito original. Para provar que não estamos errados, convidamos 10 especialistas para indicar uma banda que você precisa ouvir para entender porquê o gênero ainda é o motor da revolução de costumes. Bola pra frente, humanidade!

 

Iggy Pop

por Camilo Rocha

Iggy Pop no palco

Iggy Pop – foto: divulgação

Provavelmente o maior ensinamento de Iggy Pop, considerado o “Godfather Of Punk” , foi o de ensinar a seus pares que é possível largar as drogas (lícitas e ilícitas) sem encaretear nos costumes e na forma de pensar. Iggy despontou em 1967 com sua banda The Stooges, já fazendo o barulho ensurdecedor que seria replicado pelas bandas da primeira geração do punk.  As performances da banda eram incendiárias, a ponto de ser a Iggy atribuída a invenção do stage diving, ato de pular do palco em cima da galera em shows de rock’n’roll.  Camilo Rocha, jornalista cultural e um dos mais importantes DJs do país, cravou Iggy Pop como o cara que deve ser ouvido, visto e lido quando o assunto é manter vivo o espírito do rock´n´roll. Os shows do cara continuam sendo uns dos melhores e mais divertidos do cenário.

Angel Olsen

Indicada por Marcelo Costa, do Scream & Yell

Marcelo Costa, criador da revista online Scream & Yell, cravou a norte americana Angel Olsen como sua indicação para nossa lista.  Adotada aos três anos por uma família de oito pessoas, a artista que já foi colocada no mesmo time de The Cure e Cocteu Twins pela Pitchfork é a representação atual  da cantora entristecida, uma personagem ressonante no rock’n’roll desde sempre.  Em entrevista à New Musical Express, que a visitou e em sua casa e conheceu sua inseparável gata Violet, pediu que o foco da conversa fosse seu animal de estimação. “Ela deve ser o foco desta conversa. É a verdadeira escritora aqui. A única que tem alma” – provocou Olsen, sobre a gata resgatada de um abrigo para animais abandonados  – “Ela tem esta tragédia de vida que todo mundo gosta de romantizar”.

A escolha de costa é estratégica. Seu mais recente vídeo, que você assiste aqui, moderniza a levada rock´n´roll setentona de T.Rex, já presente no código dos ouvintes mais tradicionais. E por falar neles…

T.Rex

Indicado por Adriana Arakake

Marc Bolan (T.Rex) no palco

Marc Bolan (T.Rex) – foto: reprodução Youtube

Marc Bolan, membro da banda de Glam Rock T. Rex, viveu pouco mas moldou o rock´n´roll e foi inspiração direta para nomes como David Bowie.  Foi modelo fotográfico, chegando a aparecer em uma das primeiras matérias de revista que apresentavam o movimento cultural Mod, na Inglaterra. Mais tarde, adotando um avatar andrógino de roupas extravagantes e maquiagens aliado a um rock´n´roll lento, cru e sexual, ajudou a criar o Glam Rock, que viria a inspirar toda uma geração de bandas americanas nos anos 70. Nossa colunista de jazz, soul e música boa Adriana Arakake indicou o T. Rex como a banda eternamente necessária para mostrar que a masculinidade no rock’n’roll passa longe da cafonice do “orgulho heterosexual” que assola nossas redes sociais hoje em dia. Marc morreu duas semanas antes de completar 30 anos em um acidente de carro no ano de 1977.

Cigarras

Indicação de Adriana e Vandré Caldas (Superkaos Produções)

A banda feminina Cigarras, liderada pelo ícone da cena roqueria curitibana Maria Paraguaya (bandas Escambau e Carnoso Vinón) , é uma dos grupos de rock mais bacanas do país. Aliando temas variados, que abordam o feminismo mais pela atitude do que pelas letras, e música absolutamente linkada com a história do rock feito no sul do país,  Cigarras é uma mostra de que o rock segue delinquente, provocativo, debochado e inclusivo, como mostra o mais recente videoclipe das garotas, Paranoia de Fumo, que você assiste aqui. O Cigarras é presença constante nos shows e podcasts produzidos pela Superkaos, bastião do rock independente brasileiro tocando pelo casal Adriana e Vandré Caldas.

Maid Of Ace

Gwen Ever

O programa de radio da diva drag Gwen Ever, Low Life In High Heels, semanal pela inglesa Deal Radio, sintetiza tudo o que esta matéria quer transmitir. Duas horas de bandas relevantes, novas ou antigas, para a renovação, ou melhor, a perpetuação do espírito rock’n’roll.  Gwen indica a banda feminina Maid Of Aces, também da Inglaterra, representante fiel do estilo Riot Grrrl e responsável por um punk rock muito responsável, como você pode conferir no vídeo da música Bone Deth .

 

 

IDLES

Carlo Bruno Montalvão

O vídeo da música A Hymn, do IDLES, é uma coisa para ser estudada. No roteiro, os cinco integrantes da banda inglesa saem de casa com seus pais, de carro (alguns de carona) para um rolê rotineiro pelas partes (bem) menos charmosas de Londres. O que no início pareceria indicar uma crítica a marmanjões não crescidos ao palco vai se mostrando um relato de como pequenos momentos ao lado dos velhos podem aquecer o coração. Dentro no carro, cada um brinca, ri, da tapinhas na perna e conversa com seus pais e mães. Eis um preceito fundamental do rock’n’roll. Explodir toda e qualquer pré definição do que é cool,  do que é certo, do que é socialmente estabelecido como normal.  A indicação foi do nosso colunista Carlo Bruno Montalvão, que assina a Noise Radar e também comanda a Brain Productions.

Psymon Spine

Alexandre Bispo

Dançante, groovy, divertida e moderna. Não podia ser diferente a indicação de banda para salvar a cena do DJ paulistano Alexandre Bispo , que em breve estreia sua coluna aqui no Music Non Stop (pronto, contei!). A banda do Brooklin (EUA), mescla “pop psicodélico com os grooves deep da música para dançar”. Dica para roqueiro tradicional de cabelo em pé, afinal as tímidas guitarras dão lugar a sintetizadores e a bateria é funky pra caramba. Música de festa. Corra atrás do Psymon Spine.

Amyl & The Sniffers

Gabriel Thomaz

Amyl & The Sniffers

Amyl & The Sniffers – foto: divulgação

Amyl & The Sniffers é da Austrália. Liderada pela energética Amy Taylor, fazem um som pesado, punk rock, com atitude que remete aos mestres do estilo como Iggy Pop e Joan Jett. “O clipe novo dele, Guided By Angels, é bom pra cacete. Acabou de sair esta semana. Eles estão arrebentando!”, conta empolgado Gabriel Thomaz, líder da banda Autoramas e fundador do selo Maxilar Records. Definitivamente uma dica para quem procura a energia visceral do rock’n’roll.

Der Baum

Letty

A banda Der Baum, do ABC Paulista, vêm encantando o cenário independente brasileiro desde que surgiram com sua competente performance, num primeiro momento influenciada por DEVO e B52’s e em uma segunda fase voltando-se para o industrial e o post-punk. Você já leu sobre eles no perfil que o Music Non Stop publicou este ano sobre a banda.  A indicação vêm da nossa especialista para assuntos rockeiros Letty, cujas matérias e entrevistas você pode conferir aqui.

Black Midi

Jota Wagner

Não poderia fechar esta lista sem dar o meu pitaco. Durante as pesquisas que faço para o meu radio show, o No Mato com Jota Wagner, descobri a banda londrina de garotos que fazem um rock’n’roll pesado, rápido e desconcertante. O Black Midi chamou a atenção do talking head David Byrne, que deu uma mãozinha para alavancar a ascensão da banda, que foi rápida. Quem anda por aí dizendo que gosta de “som pesado” vai tremer feito taquara na frente desta garotada.

 

 

 

 

 

 

 

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.

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