Lançado mundialmente no último dia 08, It’s Never Over, Jeff Buckley conta a trágica histórica do ícone americano
Mary Guibert fez algo difícil de imaginar no mundo do entretenimento. Barrou uma cinebiografia dedicada ao seu filho, Jeff Buckley, um gênio da música morto precocemente, aos 30 anos de idade, estrelada por uma dos maiores astros do cinema mundial, Brad Pitt. Fã da música e da história do filho, o galã de renome mundial propôs a mãe produzir um filme sobre Buckley, poucos anos após sua morte, em 1997. “Ninguém conseguiria interpretar Jeff”, foi a resposta final que ouviu.
A negativa veio de uma mulher que tinha conhecimento do show business. Apesar de violonista e pianista clássica, Mary trabalhou como produtora em rádios e TVs locais. Conhecia as iscas usadas pelos pescadores de audiência e tratou de proteger com imensa acurácia a imagem do filho. Jeff estava em Memphis (Tennessee, EUA) gravando seu segundo disco e, aproveitando um tempo que tinha antes de a banda chegar ao estúdio, foi com o amigo Keith Foti até o Rio Mississipi para nadar durante a noite. Foti o ouviu cantar Whole Lotta Love, do Led Zeppelin, boiando na água. Foi ao carro e, ao voltar, não encontrou mais o amigo.
Contrariando a mórbida expectativa romântica do rockstar inquieto, revoltado e autodestrutivo de muitos, exames feito em seu corpo, encontrado cerca de uma semana depois, revelaram que o artista estava completamente limpo de álcool ou drogas. E tanto amigos, quanto família, descartaram qualquer possibilidade de suicídio. O que aconteceu com Jeff Buckley foi um triste acidente, causado pela má ideia de nadar em um local desconhecido.
Um prato cheio para as rádios e TV em que Guibert tanto trabalhou, e também para as cinebios, tão afeitas a licenças poéticas e distorções biográficas necessárias para “manter o ritmo” de um filme. Nem mesmo Brad Pitt foi capaz de convencê-la a mudar de ideia, principalmente enquanto ainda vivia o luto da perda do filho. A solução encontrada entre ela e o ator foi transformar o projeto em um documentário, com registros reais do músico. It’s Never Over, Jeff Buckley foi lançado oficialmente pela Magnolia Pictures no último dia 08, e em breve estará disponível para streaming na HBO Max. A direção ficou a cargo de Amy Berg. A produção executiva foi de Brad Pitt.
Jeff Buckley foi um fenômeno musical já em seu primeiro álbum, o elogiadíssimo Grace, lançado pela Columbia Records, depois que um olheiro da gravadora o viu cantar em um barzinho chamado Sin-é, em Nova Iorque, fazendo voz e violão. Originalmente um bar dedicado a músicos de cover tocando enquanto o povo dava pouca atenção ao artista, Buckley provocou um reviravolta no local. Foi juntando fãs, tocando suas músicas e outras, bastante desconhecidas, enquanto reunia uma massa que batia ponto no bar para vê-lo. Belo, triste e inquieto, preenchia uma lacuna deixada por Chet Baker e Jim Morrison, aproveitando-se da aura de ser filho do astro do folk-rock, Tim Buckley. O fato do pai ter morrido de overdose aos 28 anos, em 1975, contribuiu para a estereotipada imagem do rockstar tradicional dada ao filho.
Jeff foi criado pela mãe e o padrasto, e só adotou o sobrenome do pai (a quem viu somente uma vez em sua vida, aos oito anos) quando iniciou-se na carreira artística. Uma busca etérea e psicanalítica através da música, já que, fisicamente, jamais poderia confrontar o progenitor sobre a completa ausência enquanto vivo. Antes de gravar seu primeiro disco, já havia sido louvado por caras que iam de Gary Lucas, do Captain Beefheart, a Robert Plant e Jimmy Page, fundadores do Led Zeppelin, que ele amava.
É a história da breve e exitosa carreira de Buckley o principal caldo do novo documentário (um outro sobre o artista, Amazing Grace: Jeff Buckley, foi lançado de forma independente em 2004). It’s Never Over, Jeff Buckley foi apresentado no Festival de Sundance de Cinema pela primeira vez em janeiro e foi alvo de boas críticas, apresentando entrevistas com ex-companheiros de banda, namoradas e, claro, a mãe, Mary Guibert.
Curiosamente, Guibert parece ter se rendido à ideia de uma cinebio, desde que fosse coprodutora. Everybody Here Wants You chegou a ser anunciado, com Reeve Carney interpretando Buckley, mas a produção ainda não saiu do papel, parado desde 2021.