Respire fundo e mergulhe na vida de um dos maiores produtores e arranjadores do mundo, o brasileiro Eumir Deodato
Eumir Deodato nasceu em junho de 1943, no Rio de Janeiro, e começou a se ligar em música muito cedo, batucando compassos aos 4 anos de idade. Autodidata, seu primeiro instrumento veio aos 12 anos, tocando acordeon sob incentivo de sua mãe e olhares tortos do pai, que sonhava com Eumir trabalhando em sua serralheria.
O mundo perdeu um serralheiro, mas ganhou um músico genial. Um dos mais celebrados no mundo todo, inclusive. E nesta quinta (18) e sexta (19), por um punhado de reais que equivalem a duas cervejas, você poderá vê-lo em ação no Sesc Pompéia, uma experiência que aconselhamos fortemente que você faça. Não sem antes mergulhar em sua extensa e muito bem-sucedida carreira. Vamos a ela, então.
Deodato adotou o piano – que o acompanha até hoje – e foi descoberto por Roberto Menescal tocando numa banda em baile de debutante, sendo chamado para ajudar a moldar o novo gênero musical genuinamente brasileiro que recém saia das fraldas, a bossa nova. Com pouco mais de 17 anos, já estava fazendo arranjos, regendo uma orquestra de 28 músicos e tocando com gente do quilate de Marcos Valle, Meirelles e Os Copa 5, Elis Regina e Wilson Simonal, com quem gravou pelo menos três discos, incluindo o clássico A Nova Dimensão do Samba, em 1964.
Ainda em 1964, com meros 22 anos, gravou seu primeiro disco solo, Inútil Paisagem, no qual rearranjou músicas de seu amigo e ídolo Tom Jobim. Sua próxima aventura foi juntar um monte de músicos de primeira – como Wilson das Neves, Ed Maciel, Dom Um Romão e Ivan Mamão – e lançar três discos sob o nome Os Catedráticos, com o qual refinaria mais ainda seu estilo de arranjador, com naipe de metais afiados e o uso de congas, atabaques e outros instrumentos de percussão. Seu talento nato e prestígio no meio musical garantiram a Deodato um posto como curador do Festival Internacional da Canção, onde teve a oportunidade de lançar a carreira de Milton Nascimento, tendo inclusive produzido seu disco de estréia homônimo – também conhecido por Travessia.
Em 1967, Deodato cruzou a linha do Equador e partiu para Nova York a convite do amigo Luiz Bonfá, com planos de produzir e arranjar projetos em parceria. Conheceu então Creed Taylor, fundador das gravadoras Impulse! e CTI Records e responsável por importar e lançar nos Estados Unidos nomes como Tom Jobim e João Gilberto. Deodato foi então convidado para trabalhar junto com Taylor e logo de cara pegou pesos-pesados da música mundial, como Aretha Franklin, Frank Sinatra e Roberta Flack. Seu groove tipicamente brasileiro, a criatividade dos arranjos e seu estilo pragmático de trabalhar correram pelo circuito artístico americano e logo ele se tornava um produtor e arranjador muito requisitado.
Em meio a isso tudo, ele encontrou tempo para gravar seu primeiro disco na gringa, o maravilhoso Prelude. Lançado no começo de 1973, a faixa que abre o álbum viria a ser seu maior sucesso comercial, a regravação de Also Sprach Zaratrusta, obra de Richard Strauss baseada nos livros de Nietzsche de mesmo nome e conhecida também por ser trilha de uma cena antológica em 2001 – Uma Odisseia no Espaço, de Stanley Kubrick.
A versão, altamente funkeada, explodiu nas paradas, vendeu mais de 5 milhões de cópias e ainda rendeu duas indicações e um prêmio Grammy, o de melhor performance instrumental de música pop em 1974. Prelude se tornou um marco do samba-jazz e do fusion e tem pelo menos outra pérola, a regravação de Carly & Carole – feita em homenagem a Carly Simon e Carole King, gravada originalmente no disco d’ Os Catedráticos – e que conta com uma cozinha formada por Ron Carter, Billy Cobham e Ray Barretto.
Seus discos subsequentes foram se tornando cada vez mais sofisticados, com arranjos grandiosos e alinhados à estética sonora do funk e da disco, área musical em que Deodato ficava mais à vontade e, não raro, dava um jeito de meter suas releituras de obras clássicas como Rhapsody In Blue (em Deodato 2, de 1973), Moonlight Serenade (em Whirlwinds, de 1974) e Bachmania (de Knights Of Fantasy, de 1979). Nessa mesma época, Deodato fez uma parceria celestial com João Donato, um encontro divino registrado no disco DonatoDeodato, onde os dois mestres desfilam elegância e balanço por pouco mais de meia hora.
O casamento da música black americana com o suíngue vindo do Brasil chamou a atenção da moçada do Earth, Wind & Fire, banda que fazia sucesso astronômico no auge da disco music. Com eles, Deodato produziu nada menos que Fantasy, hit arrasa-quarteirão e mais um campeão de vendas para o currículo do brasileiro. Entre 1979 e 1983 ele assume a mesa de controle e assina a produção dos discos de outra banda de muito sucesso na época, o Kool & The Gang, e de novo acerta em cheio com os hits Ladies Night, Get Down On It e Celebration, que disputa com Good Times do Chic o título de hino dessa era musical de muita meia de lurex, disco ball e excessos em todos os sentidos.
No meio dos anos 80, Deodato partiu para outro desafio: entrar no mundo do cinema via trilhas sonoras encomendadas, nicho em que construiu outra carreira bem-sucedida. Trabalhou nas trilhas de Caça-Fantasmas II, Muito Além do Jardim e Assassinato a Sangue Frio, entre outras, e se dedicou ao novo ofício durante toda a década. No começo dos anos 90, voltou à produção musical mainstream quando aceitou trabalhar com a cantora Björk, que o convidou para fazer os arranjos de seu segundo disco (Post, de 1995) depois de pirar quando ouviu Travessia, de Milton Nascimento. A dupla ainda trabalhou junto no disco de remix Telegram – a reconstrução de Isobel feita pelo próprio Deodato virou hit nas pistinhas – e também no disco posterior da cantora, Homogenic, de 1997.
EUMIR DEODATO @ SESC POMPÉIA
Quinta (18) e sexta (19) de janeiro, às 21h
Rua Clélia, 93, São Paulo
Ingressos: de R$ 9 a R$ 30