Air - Moon Safari Foto: Reprodução

Air revela os ingredientes de sua obra-prima, “Moon Safari”

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Em entrevista coletiva, dupla francesa entregou as principais referências do álbum que será tocado na íntegra no C6 Fest

A menos de 30 dias de seu subir ao palco do C6 Fest, no dia 24 de maio, a dupla criadora do Air, Nicolas Godin e Jean-Benoît Dunckel, conversou com o Music Non Stop sobre o seminal álbum que lançou há 25 anos, e que será tocado na íntegra durante a apresentação, Moon Safari.

A importância do duo francês pode passar despercebida para as novas gerações da música eletrônica. Mas acreditem, eles viraram o mundo de ponta-cabeça. Em um momento em que tudo era “pra cima”, com faixas de house, techno, trance e drum’n’bass fazendo os europeus baterem cabeça em em raves por todo continente, Moon Safari chegou, sim, como um sopro de “ar” fresco.

Havia músicas com batidas mais lentas, chamadas downtempo, mas que se dividiam em faixas mergulhadas no ambient meditativo ou no soturno e melancólico trip-hop. Da França de Air veio algo chique, supercool, romântico e feliz, se equilibrando no muro que separava o sofisticado e o cafona, semelhante ao que, no jazz por exemplo, separa Chet Baker de Kenny G.

Crítica, público, o povo do cinema, do teatro, da dança, não houve quem não se apaixonasse por Moon Safari, e por isso é tão histórica a sua apresentação em breve sob as árvores do Parque Ibirapuera. O Air foi revolucionário trazendo paz e tranquilidade. 25 anos depois, mais necessárias do que nunca. No mundo da arte, no entanto, tudo vem de algum lugar. Quem cria consumiu criações anteriores. E no caso de algo tão popular e acessível como a música, consumiu desde bebê, em casa, enquanto os pais colocavam um disco na vitrola.

E é por isso que uma dúvida sempre pipocou na cabeça de tanta gente ao redor do mundo, nas duas últimas décadas e meia: de onde veio o Air? Que ingredientes foram usados para formar um álbum absolutamente perfeito, na contramão de tudo o que se estava fazendo na época? Para desvendar esse mistério, a pergunta foi direto na vértebra, em coletiva de imprensa realizada nesta quarta-feira: “quais discos tiveram influência direta na criação de Moon Safari?”.

“A ideia era fazer uma mistura de Kraftwerk com Ennio Morricone” conta Godin, que adiciona mais um ingrediente ao seu poivré musical: “Compramos vários instrumentos usados em Songs in the Key of Lifedo Stevie Wonder. A talkbox, o piano Fender Rhodes… muitos dos sons foram tirados desse álbum”.

A resposta foi tão esclarecedora que até mesmo quem ainda não ouviu Moon Safari consegue compreender do que o álbum se trata. Seu tronco e sua raiz vieram destes três discos, efetivamente, mas não somente. O parça Dunckel aprofundou-se mais nas referências, trazendo o elemento francês (o melhor deles) para a lista:

“Na composição das canções tem um pouco de Maurice Ravel, Claude Debussi e Erik Satie — todos estes compositores do início do século XX. Porque eu realmente gosto de como eles faziam suas harmonias flutuarem no espaço. E o Air é sobre flutuar, também”.

Alguém aí se lembrou do macaquinho Sexy Boy viajando pelas galáxias em sua perua espacial? Pois é, mensagem recebida.

“Há também muita influência de séries de TV de ficção científica, como a Cosmos [de Carl Sagan]. Eu adorava este tipo de série. Incluo também na lista Pet Sounds, dos Beach Boys, e um disco chamado Insects Are All Around Us, do Money Mark“, completa, para deleite dos arqueólogos musicais, Dunckel.

Entregando a escalação da seleção de referências usadas no disco, embebidos de autoconfiança, a dupla demonstrou imenso carinho por Moon Safari, pelo Air e pelo seu público. Nem de longe vivem do passado. Ambos se divertem fazendo trilhas sonora para a TV, teatro, dança e exposições. Ambos têm completa noção do legado que deixaram, e por isso toparam viajar pelo mundo para celebrar, nos últimos anos, sua criação. É isso que veremos no próximo C6 Fest, uma celebração. E vai ser muito mais divertido agora, conscientes das referências que trouxeram essa obra-prima ao mundo.

As principais referências que o Air usou para fazer Moon Safari

Stevie Wonder – Songs in the Key of Life (1976)

Kraftwerk – The Man-Machine (1979)

Ennio Morricone – The Good, The Bad And The Ugly (1966)

The Beach Boys – Pet Sounds (1966)

Money Mark – Mark’s Keyboard Repair (1995)

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.