Artistas brasileiros se unem para lançar um dos melhores tributos ao Kraftwerk disponíveis
Finalmente conseguimos descontar o 7 x 1. E foi através de um incrível tributo ao Kraftwerk feito só por artistas brasileiros.
Kraftwerk, alemães que já foram rotulados (por jornalistas ingleses) como o grupo “mais influente que os Beatles”, segue sendo cultuado após mais de cinquenta anos do lançamento de seu primeiro disco.
Mais do que isso, segue influenciando artistas de todo o globo e não é a toa. O quarteto de Düsseldorf é considerado o pai do synthpop de Depeche Mode e Human League; cravou seus beats na aurora do hip-hop, quando duas de suas músicas (Numbers e Trans Europe Express), foram usadas para criar o hino Planet Rock, de Afrika Bambaata; definiu a estrutura, ainda que por tabela, dos alicerces da House Music, do Techno e do Miami Bass (pai do nosso funk carioca). E daria para esticar muito mais este parágrafo. O anti-rock de Kraftwerk apresentou ao mundo uma saída para a aparentemente obrigatória autobahn (hah!) do blues na música pop do pós guerra.
Surpreendente e ousado
É possível que o Kraftwerk seja um dos grupos que mais têm “tributos” pelo mundo. Basicamente, um montão de bandas se unindo para revisitar suas músicas pelos “cantos” deste planeta que, sabemos, é redondo. Eis que, orgulhosamente, artistas brasileiros se uniram, a convite do selo brasileiro Maxilar, para lançar um conjunto de versões dos “quatro de Düsseldorf” absolutamente incrível.
O disco Um Tributo Brasileiro ao Kraftwerk é sublime. As reinterpretações dos clássicos da banda alemã são surpreendentes, ousados e bons de pista. A identidade dos artistas é preservada sem medo, e o que se ouve não é apenas um “tributo”, mas um desafio.
O time escalado para esta goleada junta artistas que estão buscando a tapas seu lugar na cena independente brasileira, como Jonatta Doll e Os Garotos Solventes e As Cigarras, com nomes já estabelecidos neste mercado maldito, caso de Gilmar Bola 8 (Mundo Livre S/A) e Tatá Aeroplano. Mas o que interessa aqui é as versões serem absolutamente subversivas.
Versões brasileiras e subversões nas letras
A versão de Pocket Calculator feita pela banda curitibanas As Cigarras, capitaneada pela icônica Maria Paraguaya, é um ótimo exemplo: as meninas deram um tempero new wave, com sabor de Mercenárias, a um dos maiores hits do Kraftwerk. No entanto, enquanto na música original a letra é “by pressing down the special key, it plays a little melody”, as Cigarras, sem vergonha nenhuma na cara, cantam “estou usando special k e tomando cogumelodies”. Na boa, se existisse um prêmio Nobel da paródia musical, certamente o de 2022 seria delas.
A coletânea traz outros diamantes, como Walter & Kim traduzindo para o português — obviamente com algumas adaptações — a letra de Neon Lights. E a mensagem continua linda (lembrando que o Kraftwerk, que originalmente gravou seus discos em alemão, nunca teve nenhum receio em regravar suas músicas em diversos idiomas diferentes como, por exemplo, italiano)!
Edu K, o gaúcho maluco do De Falla, responsável pelo super hit Poposuda Rock’n’Roll, apropriou-se de Boing Boom Tschak (music…. non stop…) e entregou uma bela homenagem, tanto ao Kraftwerk, quanto às raízes do Miami Bass e, por consequência, ao funk carioca.
Gilmar Bola 8, ex Nação Zumbi, transmutou Space Lab em Mangue Beat, um trabalho tão bacana que você acaba se esquecendo de comparar com a original. A impressão é que a música foi composta em Recife.
O disco tem tantas faixas surpreendentes – Airwaves do Space Rave, Radioativity com um feat de Jonnata Doll e Tatá Aeroplano e Showroom Dummies, do Anvil FX (também traduzida para o português) – que seria um tremendo spoiler citar cada um.
Kraftwerk com caipirinha
O ponto crucial é: esta turma lançou possivelmente um dos melhores tributos já feitos ao Kraftwerk. Díspares, criativos e, principalmente, ousados.
Quando os quatro integrantes originais do Kraftwerk estiveram pela primeira vez no Brasil, para shows no Free Jazz Festival, em 1998, me lembro de ter conversado com o colega Tom Leão, que teve o privilégio de levar os intocáveis “trabalhadores da música” (como se auto denominam) para um rolê pela noite carioca. Tom me contou que, ao contrário do que muitos de nós poderíamos imaginar, os autômatos pais da música eletrônica sorriram! E mais: tomaram caipirinha!
Talvez este seja a melhor forma de definir este sensacional tributo: Kraftwerk, chapado de caipirinha, na madrugada de Copacabana.
Por enquanto, o tributo só pode ser encontrado no Youtube. Confira: