Alvará se torna vilão da noite. Falamos com festas, clubes e poder público para entender por que o seu rolê pode estar em risco

Claudia Assef
Por Claudia Assef

A noite, o fervo, a música eletrônica, a jogação, a boemia, o flanar de festa em festa, até a última vez que eu tinha checado, é um dos maiores patrimônios de São Paulo. Pois corre-se o risco de um pedaço de papel (ou melhor, um punhado de folhas com carimbos) se tornar responsável por mudar muito o panorama do que conhecemos como noite hoje em dia.

Mais uma vez, o alvará é alvo de muita dor de cabeça e bode expiatório central de desentendimentos entre duas cenas que compõem, cada uma à sua maneira, o panorama da noite em São Paulo. De um lado, as festas independentes, que ao mesmo tempo em que crescem e ganham corpo, sofrem cada vez mais revezes por conta de fiscalizações e embargos; de outro, as casas noturnas, que há cerca de três anos se uniram sob o manto de uma associação para defender seus direitos junto ao poder público – e precisam rebolar pra se adaptar a novidades impostas pela legislação, como um decreto que altera a Lei Antifumo – atualmente os estabelecimentos não podem ter nenhum tipo de fumódromo – ou o projeto do vereador Milton Leite, que exige a colocação de catraca e chuveiros automáticos (“sprinklers) nas casas noturnas.

Criada com o nome de ANEP (Associação da Noite e Entretenimento Paulistano), mas conhecida também como ABCNESP (Associação de Bares, Casas Noturnas e Entretenimento de SP), a associação reúne cerca de 30 empresários da noite, entre eles nomes como Renato Ratier (D-Edge/Warung), Flávia Ceccato (ex-Lov.e, atual Hot Hot) e Klaus Ebone (The Week). Segundo eles, a maior luta dos associados tem como objetivo alterar a Lei dos Alvarás de Casas Noturnas e Casas de Entretenimento e Eventos, criada em 1992 pela prefeita Luiza Erundina, ainda vigente. A associação já teve sua primeira conquista. Na última quarta (7), alguns de seus integrantes foram recebidos por Milton Leite, atual presidente da Câmara de Vereadores. “Ele pediu que a gente colocasse no papel as mudanças que nós gostaríamos que fossem feitas na Lei. Foi um primeiro passo, mas uma conquista histórica”, diz Flávia Ceccato, que esteve presente na reunião.

Com recentes embargos de festas, como o da ODD que aconteceu na mesma noite da Virada Cultural e foi fechada pelo Secretário Adjunto das Secretarias Regionais, Fabio Lepique em pessoa, as festas se organizam para trabalhar com alvarás – mesmo que uma das questões sinequanon para isso seja que o IPTU do imóvel a ser utilizado (muitas vezes fábricas desativadas com enormes cifras de IPTU em haver) esteja em dia.

CLIQUE PARA VER A LISTA DE DOCUMENTOS PARA TIRAR UM ALVARÁ TEMPORÁRIO EM SÃO PAULO

No âmbito nacional, o cerco também se fecha. Em março deste ano, a Câmara dos Deputados aprovou projeto que determina regras mais rígidas de segurança e funcionamento para casas noturnas. O texto ainda precisa ser sancionado e prevê, entre outras coisas, a proibição do uso de comandas, divulgação do alvará de funcionamento e capacidade máxima na porta do evento e punição para superlotação. O projeto, que data de 2007, passou a ser chamado de Lei Kiss, em referência ao incêndio que matou 242 pessoas na Boate Kiss, em Santa Maria (RS), no início de 2013.

Do lado dos clubes, trâmites legais também são morosos e podem ter o ônus de surpresas indesejadas, como um decreto de novembro do ano passado que “considera prejudicial ao sossego público a presença de pessoas que, ainda que estejam fora do estabelecimento, sejam por ele servidos, atendidos, ou estejam de qualquer forma a ele relacionados, gerando incomodidade”. Ou seja, cabe aos estabelecimentos a responsabilidade por gente que está na calçada ou ouvindo música dentro de um carro, se esse estiver nas proximidades da casa noturna.

Uma saudade: SP na Rua realizada em setembro de 2016 nas ruas do Centro reunindo núcleos de festas independentes

Dos dois lados, há muita especulação. Mas o fato é que ninguém quer que a noite de São Paulo esmoreça. A lei precisa mudar. As festas precisam continuar. Os clubes têm que poder operar sem serem obrigados a pagar propina a fiscais. E por que, afinal, um alvará de funcionamento leva tanto tempo pra sair e custa tão caro?

Pra jogar mais lenha no soundsystem, boatos acirram inimizades entre clubes e festas. Afinal, o que querem as festas? E o que pensam os donos de clubes? E o vice-prefeito, vai mexer uns pauzinhos pra atualizar essa lei que foi decretada quando ainda nem havia internet no Brasil? O Music Non Stop foi falar com geral pra entender os fatos.

ANEP: UNIDOS PARA MUDAR A LEI DOS ALVARÁS

BETO LAGO, coordenador de Economia Criativa na Prefeitura de Campinas e presidente da ANEP (Associação da Noite e Entretenimento Paulistano), que vinha sendo chamada de ABCENESP.

Beto Lago, da ANEP: “nossa atuação será de cunho político”

A Associação foi criada em 2013 pra defender a classe diante dos políticos. Não adianta um dono de clube ter um problema e usar o contato dele na Prefeitura pra resolvê-lo individualmente. Isso não representa um segmento. No decorrer desses anos foram aparecendo outras demandas do setor, a última foi quanto à Lei do Fumódromo. A gente tá abordando questões grandes do segmento, do ponto de vista de legislação. A gente criou essa associação heterogênea. Eu mesmo criei a Parada da Paz, fiz Mundo Mix, a mesma coisa aconteceu com a Lei dos Food Trucks, eu ajudei a criar uma legislação pra que ela se tornasse algo legal. Nossa atuação vai ser muito de cunho político na área da legislação.

Nossa posição em relação às festas independentes é que elas precisam estar regulamentadas, por conta da segurança de quem as frequenta. É claro que as festas têm que existir, mas se acontece alguma coisa numa delas, isso desanda toda a categoria. A gente quer criar um núcleo dentro da ANEP para levar as demandas das festas itinerantes.

Nossa maior preocupação hoje é sobre as leis em torno da economia criativa da noite. A Associação nunca pensou em acabar com as festas, ao contrário! Queremos abrir um canal com as festas itinerantes, bem como com o Carnaval de Rua. Queremos ser interlocutores dessas novas formas de diversão. Já vimos esse modelo acontecer em outros países. Agora o que temos que fazer é apoiar o segmento. Tem uma série de questões: Lei do Psiu, Alvarás, Lei do Fumódromo. O poder público só pode atender demandas de uma associação. Quando mexe com político, a gente precisa ter representação legal: seja boate, festas, bloco de carnaval, festival, show.

Nossa Senhora do Alvará irá nos ajudar? Arte criada por Lucio Kahara, de Porto Alegre, da festa Neon

Os próprios donos das casas noturnas também estão itinerando, isso é até uma sobrevida para os clubes. Temos cerca de 30 casas representadas na associação, mas nossa ideia é abrir pra São Paulo inteira. Temos casas sertaneja, GLS, música eletrônica, produtores de eventos. Das 30 casas, talvez umas quatro sejam mais focadas em música eletrônica.

Hoje em dia pra você tirar um alvará pra fazer uma festa, tem que começar o processo com um prazo de no mínimo dois meses antes do evento. Daí tem que contratar um arquiteto pra apresentar as portas de saída, precisa ter ambulância. Pra tirar um alvará hoje em dia tem que querer muito! Por isso estamos propondo que sejam criados os Alvarás Criativos, porque uma festa de música eletrônica não precisa ter a mesma estrutura de um show da Madonna! É através desses mecanismos que iremos conseguir legalizar todas as festas. Eu mesmo, com o Mundo Mix, não consigo pegar um galpão do zero e tirar todos os alvarás.

Outra razão da associação é a gente acabar com as propinas. Fiscal de tudo que é área, você pode estar com tudo certo e os caras podem fechar a sua casa se você não molhar a mão.

A gente não concorda com a atual Lei dos Alvarás. Já foi pedido um estudo pra nós de como seria o cenário ideal. Nós vamos fazer isso e apresentar para a Câmara, pensando na segurança e bem-estar das pessoas, mas com facilitações para que a noite possa seguir em evolução. Vamos montar um grupo de trabalho para elaborar esse texto e queremos contar com representantes de festas itinerantes e também de blocos de Carnaval de São Paulo.

O TEXTO ABAIXO FOI ENVIADO PELA ANEP AO VICE-PREFEITO BRUNO COVAS

São Paulo tem vocação para as festas e eventos noturnos, mas a burocracia atrapalha. Vamos propor uma lei para a concessão de alvarás. O entretenimento é a praia dos paulistanos. As baladas, festas e eventos noturnos movimentam a economia gerando empregos e serviços para muita gente. Aliás, todo paulistano sabe que o nosso lazer se compõe da área cultural, gastronômica e da área da noite, transformando São Paulo numa das principais capitais nestas áreas em todo o mundo, sendo comparada a Nova York, Londres e Berlim. Apoiar a noite é um trabalho fundamental no estímulo à economia criativa. Não podemos mais viver regidos por leis foram feitas há décadas e que até hoje não foram modernizadas, como é o caso da Lei dos Alvarás de Casas Noturnas e Casas de Entretenimento e Eventos. Vocês sabiam que mais de oito órgãos municipais podem arbitrar e decidir se um local pode ter o alvará ou não? É urgente termos uma nova lei que desburocratize, que jogue a favor do empreendedor dessas áreas para abrirem novos estabelecimentos, uma lei que evite que os empresários dessa área fiquem nas mãos de fiscais mal-intencionados, fazendo da dificuldade legislativa um modo de chantagem dificultando o crescimento e profissionalização desse segmento. São Paulo é uma cidade que funciona 24 horas e uma lei nova de alvará de funcionamento tem que ser urgentemente discutida na Câmara. Outras cidades brasileiras adotaram esse modelo, como o Rio de Janeiro, onde a ordem dos fatores foi invertida, cabendo aos empresários fazerem tudo que está previsto nas leis e, se isso for feito, a prefeitura ter um prazo máximo para liberar a obtenção de alvarás. Estamos perdendo eventos que poderiam gerar riqueza para nosso município. Temos que reagir, São Paulo não pode parar.

“NUNCA FOMOS CHAMADAS PRA FAZER PARTE DA ASSOCIAÇÃO”

CASHU, DJ e fundadora da MAMBA NEGRA (junto com Laura Diaz)

Com quatro anos de estrada, a Mamba Negra se tornou uma das maiores festas independentes de São Paulo

A gente já esperava que fosse acontecer uma dificuldade por conta da virada de gestão e por conta de brigas de clubes com festas. Pra gente nem significa uma briga porque eu nunca estive presente nesta cena de clubes de SP. Foi um espaço que a gente abriu, com outros interesses. É um momento crítico, mas que tá sendo muito importante, pra cidade e pra cena.

Cashu: “2017 começou com muita energia dessa cena”

 

A galera tá tendo que se unir, como aconteceu no aniversário de São Paulo, no Tekno de Bairro (junto com Dusk, Caldo e Dsviante). Fizemos um ato na rua, foi muito simbólico. Estávamos sentindo falta de fazer mais festas na rua. Contudo, com essa mudança de gestão não estão emitindo autorização para nada na rua. Uma pena. A cidade tem que ter cultura acessível também. Essa no Aniversario de São Paulo tivemos que fazer na raça. Depois fizemos uma na rua Prates, uma rua sem saída, em conjunto com a Cia Mungunzá de Teatro, o Instituto Prates e o abrigo de trans Florescer. O Trio Elétrico mandamos como ato, e notificamos a prefeitura, como direito de nos manifestar. O Trio Elétrico foi a terceira festa este ano. 2017 começou com muita energia dessa cena, isso está me deixando super-animada na real rs.

Não teria porque não se juntar com uma associação. Porém nós nunca fomos chamadas pra participar dessa associação, nunca teve esse contato. Então o que dá a entender é que ela nasceu para se proteger do movimento das festas independentes que estão movimentando tanta gente. Não sei até que ponto isso seria possível, acho um pouco ilusão, mas não seria contra tentar alguma articulação caso acontecesse. É claro se os interesses não forem muito divergentes, e que não visem acabar com as nossas ideologias.

A gente vem fazendo tudo o mais legalizado possível, nos últimos anos. Temos feito tudo certinho, as festas desde ano passado têm alvará, assim como muitas outras festas grandes têm alvará. Temos ambulância, os lugares são muito abertos, têm grandes áreas de escape, segurança, assim como uma energia acolhedora. A Mamba desde ano passado tem dado 1.500 a 2.300 pessoas, logo seria impossível funcionar no caos. Com a festa desse tamanho, seria muita irresponsabilidade com os frequentadores. Não é possível que eles não pensem isso. É tudo muito bem feito, com muito carinho, todo mundo é pago, não é um ambiente perigoso.

“PRECISAMOS DE ESPAÇOS ADEQUADOS PRA FAZER AS COISAS QUE A GENTE QUER FAZER”

LAURA DIAZ, cantora e compositora (Teto Preto) e fundadora da MAMBA NEGRA (junto com Cashu)

A Mamba tem sido uma ferramenta de intervenção cultural. Acho que celebrar neste momento é um ato de resistência. Até porque ocupamos fábricas, imóveis que estão abandonados, lugares que estão com IPTU atrasado, com alguma treta de família, somos empurrados pra esses lugares que têm uma estrutura boa pra receber as festas. Chegamos lá ressignificando esses lugares. As casas de entretenimento não comportam o tipo de produção que está sendo feito agora, é uma produção jovem, autoral, brasileira, uma produção que toca em questões de gênero e liberdade sem moralismo.

ATO PÚBLICO DA MAMBA NEGRA APÓS FESTA DE 4 ANOS DO NÚCLEO

Fabio Lepique publicando que não vai mais tolerar outra Santa Maria na história… Queria só lembrar que a maioria das pessoas que morreram naquela tragédia foi porque os seguranças queriam que elas acertassem a comanda e fecharam as portas. A gente tem muitas diferenças. Querem moralizar essa questão e colocar sob um ponto de vista meramente legalista. Ninguém tem interesse em ficar na ilegalidade.

A maior dificuldade em relação ao alvará é que esses imóveis que são em zonas industriais, que têm portas largas, ventilação boa, eles foram muitas vezes fábricas que têm dívidas imensas de IPTU. E pra você expedir o alvará, por exemplo, o imóvel precisa estar com o IPTU em dia. Então pra gente todos esses joguetes são história pra boi dormir.

O que a gente precisa é de espaços adequados pras coisas que a gente quer fazer, capaz de comportar o público que esta cena criou em SP. Eles podem dar o viés legal, mandar fiscal, aplicar multa, mas nós entraremos com o viés político, a gente vai pra rua. A gente só quer exercer nosso trabalho. A gente quer fazer a nossa cena acontecer. Queremos as trans performando em cima da caixa de som, as minas comandando o rolê, a gente quer a produção de agora rolando nos lugares, pode ser em clube, pode ser em festival, pode ser na TV, por que não?

Tem que dialogar com a gente. Temos feito a cultura rolar em condições toscas há 10 anos em São Paulo. A gente desenvolve um comércio local, tem capilarização, mora nesses lugares. Numa cidade com o tanto de jovem que tem em SP é um absurdo não ter espaços públicos. A gente não tem o mínimo de apoio.

“DIFICULDADE PARA CONSEGUIR ALVARÁS NÃO FOI CRIADA POR ESTA GESTÃO”

BRUNO COVAS, vice-prefeito de São Paulo

Music Non Stop – Existe uma demanda por parte da ANEP para que a política de alvarás de funcionamento de casas noturnas seja colocada em termos factíveis – eles dizem que o processo todo é quase impossível de ser realizado e leva muito tempo, o que abre para a possibilidade de fiscais pedirem propinas para “acelerar”. Vocês consideram acatar o documento e alterar a esse de lei de alvarás?

Bruno Covas – A gente precisa ter regras claras para que as pessoas possa operar dentro da legalidade. Essa não é uma questão específica desse setor. Um exemplo, entrou agora em maio um sistema eletrônico para abertura de empresas na cidade de SP. O que levava em média 126 dias, agora pra empresas de baixo impacto, q somam 80% dos processos, leva no máximo 7 dias. A gente tá trabalhando na desburocratização como um todo. No caso da ABCENESP (atualmente ANEP) facilita porque eles trouxeram um documento, em que nós estamos debruçados, estudando. Mas é claro que estamos querendo resolver isso não só pra eles, mas pra toda a cidade.

Music Non Stop – A noite é uma das principais atrações turísticas e um patrimônio de que São Paulo pode se orgulhar. Quais serão as políticas de incentivo/aceleração para esta área durante a gestão vigente?

Bruno Covas – Não é à toa que se criou recentemente dentro da Secretaria do Trabalho e empreendedorismo uma área específica pra economia criativa aqui na cidade de SP. A gente reconhece que essa é uma saída estratégica para a retomada do crescimento e pra geração de emprego e renda. SP é uma cidade vocacionada para os serviços, e a economia criativa, além de aproveitar o que temos de potencial de RH na cidade, é uma economia da baixo carbono, voltada às políticas de mudança climática. Então tem tudo pra poder incentivar isso, portanto há um diálogo permanente com a Secretaria do Trabalho e Empreendedorismo e também com a de Cultura, que são relacionadas ao fomento disso. Claro que, apesar das baladas de SP serem um grande orgulho, um patrimônio, cabe aqui à Secretaria de Prefeituras Regionais garantir a segurança e o cumprimento da lei, para que as pessoas possam participar de eventos seguros.

Music Non Stop – Houve recentemente um embargo de uma festa feito pelo Sr. Fábio Lepique pessoalmente, que depois publicou na página do Facebook que “em São Paulo não haverá uma boate Kiss”. Qual teria sido a motivação para o fechamento da festa?

Bruno Covas – Aquela festa não tinha autorização da Prefeitura. Se tivesse papéis a festa não teria sido interditada. Se eles tivessem 100% das autorizações necessárias e a festa tivesse sido fechada, eles poderiam ter entrado com uma ação contra a Prefeitura. O evento foi fechado porque não tinha documentação.

Music Non Stop – Um decreto de 10 de novembro, numero 57443, diz que os fiscais não precisam mais usar decibelímetro para aferir a emissão de ruídos de uma casa noturna. Enquanto isso, uma lanchonete ou casa de sucos pode produzir o barulho que quiser, pois a lei só incide sobre estabelecimentos que vendem álcool. 1) Não é delicado abrir para julgamentos subjetivos dos ficais? 2) Não seria melhor haver uma isonomia entre todos os estabelecimentos?

Bruno Covas – São duas questões. Quando você diz que uma casa de sucos pode emitir o barulho que quiser, isso não é verdade. Você tem duas restrições. Uma, que é da poluição sonora. Qualquer estabelecimento continua sucetível a aferição via decibelímetro de acordo com o ruído que pode causar de acordo com a Lei de Ocupação do Solo. Tem restrições, 30, 70, 80 db. O fiscal pode chegar com o aparelho pra medir. Além dessas restrições que servem para todos estabelecimentos, você tem uma específica voltada a estabelecimentos que vendem bebida alcóolica, que a partir da 1h ele não pode gerar nenhum ruído. Ou seja, ou ele tem isolamento acústico ou ele fecha. São duas regras!

Music Non Stop – É sabido que os “pancadões” são uma grande preocupação da Prefeitura e vêm sendo fechados. Não seria o caso de analisar os diferentes tipos de entretenimento noturno e diferenciar as exigências de acordo com suas particularidades?

Bruno Covas – Em relação aos pancadões, nenhuma tolerância. Começamos um programa na Cidade Tiradentes, porque ali era o ponto da cidade com o maior número de pancadões, uma operação conjunta com Prefeitura Regional de Tiradentes, GCM, CET e Polícia Militar pra coibir os pancadões. No final do ano passado, havia 40 pontos de pancadão lá na Cidade Tiradentes. Este ano conseguimos zerar. E estamos levando esse programa pra toda a cidade. Tanto que o PSIU estava concentrado na Secretaria de Prefeituras Regionais, você não tinha nenhum fiscal habilitado a fazer a fiscalização de poluição sonora, a gente já repassou essa atribuição para a as Prefeituras Regionais no que diz respeito à Lei da 1h e do Pancadão. Pra gente não há nenhuma relação entre casa noturna e pancadão.

Music Non Stop – Essa comunidade que vive em torno do pancadão… muitas vezes é um entretenimento legítimo. Vocês estão criando outra fonte de lazer pro pessoal que ficou órfão dessas festas?

Bruno Covas – Claro, na Cidade Tiradentes o Prefeito tem buscado em parceria com a Secretaria de Cultura alternativas para a população. Agora não é a falta de alternativa que permite a pessoas agirem fora da lei.

Music Non Stop – Uma outra festa de música eletrônica, a Mamba Negra, teve muita dificuldade para acontecer, e acabou sendo realizada na Via Matarazzo, com toda a papelada em ordem. Depois da festa elas fizeram um ato público, avisaram CGM, CET etc. Esses produtores estão trazendo uma forma diferente de fazer festas, de uma forma muito artesanal, que acontecem com uma regularidade diferente de um clube, ou seja, não funciona sempre. Esses produtores encontram bastante dificuldade para conseguir alvarás. Já conversei com muitos deles e eles têm uma enorme preocupação com a segurança do público e querem existir de forma legal. Como eles podem fazer isso?

Bruno Covas – A Prefeitura vem trabalhando desde janeiro para desburocratizar. Seja para conseguir alvará de festa, ou qualquer outro serviço da Prefeitura, não foi uma regra criada pela atual gestão. Estamos falando de um estoque de burocracia que estamos lidando que tem quase 500 anos de história. Eventos como esse podem buscar um alvará temporário. Ou então buscarem realizar seus eventos em casas que já tenham alvará de funcionamento. Embora a gente reconheça a manifestação cultura, a importância da música e das baladas pra cidade de São Paulo, claro que a Prefeitura nunca vai abrir mão da segurança das pessoas e do respeito à lei.

Music Non Stop – Os alvarás, seja de clubes ou os temporários, são muito difíceis e caros de serem tirados. Vocês vão adiante com os planos de facilitar esse processo?

Bruno Covas – Já estamos verificando essa documentação encaminhada pela ABCENESP pra ver o que é possível mudar. Qualquer outra sugestão, estamos à disposição para o diálogo.

Music Non Stop – As pessoas podem mandar demandas, pedir reunião com você? Como funciona?

Bruno Covas – Claro, pode mandar direto pro meu email: brunocovas@prefeitura.sp.gov.br ou podem ligar aqui no meu gabinete, 3113-8215 e marcar uma reunião com o Gustavo, que é quem cuida da minha agenda.

“EU MESMO FARIA MAIS FESTAS EM LUGARES DIFERENTES SE FOSSE MAIS VIÁVEL”

O D-Edge, na Barra Funda, é um dos clubes mais famosos do mundo, conhecido por sua programação focada em bons artistas

RENATO RATIER, DJ e dono do D-Edge e sócio do Warung

A nossa luta não é pra que fechem as festas. É pra que seja mais fácil pra todo mundo tirar licença. Eu mesmo faria mais festas e festivais em lugares diferentes. Até em festivais como DGTL e Dekmantel houve problemas.

Eu, que tenho um clube há anos, por que não faço um festival grande toda hora? O risco que você tem com as pessoas, o que é cobrado de fiscais que ficam em cima, ECAD, etc. é muito grande. Mas a gente quer que as festas sejam fiscalizadas assim como os clubes são. Se nós temos deveres e direitos, as festas também precisam ter. Daqui a pouco a gente vai ter que fechar os clubes, daí a cidade vai perder o ISS que pagamos. A gente é fiscalizado e multado a toda hora. E nossa luta é que as leis sejam compatíveis entre si. Que seja mais fácil tirar licença. Nossa associação não foi criada pra acabar com as festas não.

Acho que sou a única pessoa que deixou público que não está certo essa desigualdade. Muitos dos organizadores fazem questão de dizer que não têm seguranças, que pode fazer qualquer coisa. Que tem liberdade, coisa que não tem em clube. Eu também não queria que tivesse [revista pesada] nos clubes, mas somo obrigados.

Renato Ratier: “queremos fiscalização igual para todos”

A gente quando tinha algum problema de renovação, entrava no Ministério Público pra entender porque estava demorando. Eles davam um alvará provisório. Por isso que a gente quer desburocratizar. A gente precisa facilitar pra todo mundo a questão de ter o alvará.

Pedimos que o alvará seja mais rápido de se conseguir e que as leis conversem entre si. O bombeiro fala uma coisa, daí o PSIU fala outra. É muito difícil serem cumpridas todas as exigências à risca.

Imposto sobre o valor de entrada, ISS, bebidas, que tem o ICMS, você tem que pagar IR sobre o lucro aferido no final do ano. Fora sindicato, renovações de ART, de tanto em tempo tem que receber um engenheiro técnico. O maior custo são os impostos. Se você coloca tudo o que a gente arrecada dá quase 40%. Eu tenho uma maioria de funcionários registrados, como é que eu faço? Hoje eu tenho quase 300 pessoas registradas fora os empregos indiretos. Acho que quando se fala em cultura tem que ter responsabilidade atrelada. Se as festas estiverem legalizadas, pagando seus alvarás, elas não conseguem cobrar o valor baixo que cobram hoje. O preço deles inclusive já teve que subir. A Associação está aberta pra que eles possam participar. Qualquer pessoa que tenha casa noturna, bar ou faça eventos é bem-vinda.

Nunca fui convidado pra tocar nessas festas. Eu iria, se estivesse tudo certo com o alvará, por exemplo. A gente faz isso com todos os artistas da agência. Se uma festa for cancelada, o artista tem que receber o cachê. Quem vai pagar? A agência. A cultura clubber é pra agregar, não é pra provocar. É a confraternização de todo mundo. O desenvolvimento da música eletrônica é de agregar, pouco importa se o cara é rico, pobre, petista, gay, não importa.

O trabalho que eu faço em SP, fiz em Campo Grande, sempre foi pra agregar. Nunca foi desenfreado por dinheiro nem política. Eu faço por amor, de gostar de investir na economia criativa.

Se a festa foi fechada e tinha os documentos devidos, eu não concordo. Isso é péssimo pra todos. As coisas têm que ser justas. Se a a ODD tinha a documentação correta, não tá certo fechar.

Só não acho justo causar esse racha, que as pessoas não param de apontar o dedo e incitar o ódio ao D-Edge. Se as festas são legais é uma coisa. Mas fica esse culto do “lá eu faço o que eu quiser”. Vamos pensar em como as coisas realmente são. O que a gente mais gasta tempo nas reuniões da associação é pra desburocratizar toda a legislação da noite. Um governo sério tem que deixar as coisas mais fáceis pra que as pessoas possam estar dentro da legalidade. Mas é preciso entender que o D-Edge teve uma grande importância na música eletrônica.

“A CIDADE MUDOU, AS LEIS PRECISAM MUDAR”

A Capslock está investindo em fazer festas com alvará: “é uma questão de responsabilidade civil”, diz Paulo Tessuto

PAULO TESSUTO, DJ e criador da CAPSLOCK

Acho que os alvarás são muito importantes, nos eventos em geral, por questões de segurança de quem está trabalhando, do público, uma responsabilidade civil. É uma responsabilidade, você está colocando as pessoas pra dentro da sua festa, tudo o que pode acontecer, o seu staff também. Acho que o grande problema é que é muito burocrático, é muito difícil tirar, demora muito tempo, é caro. Têm que ser rediscutidas as leis pra esse tipo de evento ou casas funcionarem. São leis muito antigas, já estão ultrapassadas. A cidade mudou muito. Existe uma demanda grande, muito emprego é gerado. Tem que se pensar também no pequeno produtor, que tem que fazer o evento dele também com segurança. Tem que poder ter acesso a isso. Ele não pode pagar a mesma coisa que uma festa pra 2.000 pessoas. Tem que existir vários modelos.

Tessuto: “é preciso que haja incentivo, as festas trazem turismo pra cidade”.

Tem que existir incentivo também, pois as festas trazem muito turismo pra cidade. Agrega muita cultura e é base pra que outros movimentos, outros empresários e pessoas que querem capitalizar esse mercado se espelhem pra fazer algo parecido pra atingir o público que ele quer atingir. É preciso que se reconheça a importância desse movimento, das festas, dos clubes, de tudo. Porque é tudo uma coisa só. No final das contas é tudo uma coisa só. Cada núcleo, cada festa, cada clube tem o seu objetivo e ideal diferente, mas operam no mesmo segmento.

“SP SEMPRE TEVE UMA NOITE FODA. E ISSO ESTÁ AMEAÇADO”

FLÁVIA CECCATO, ex-proprietária do LOV.E CLUB e atual sócia do HOT HOT

O Lov.e teve vários projetos em parceria com a Prefeitura e aquele foi um momento muito especial, por uma pessoa que teve a vontade e a sensibilidade de se aproximar, e que entendia que poderia haver ali a possibilidade de inclusão social através da música. Esse cara foi o Alexandre Youssef, que na época era Coordenador da Juventude (secretaria que foi extinta). Essa secretaria fomentou o hip hop, o grafite, o skate, a música eletrônica e as vozes dos jovens que nunca tinham sido ouvidas. O Lov.e por São Paulo levava gratuitamente os DJs que só poderiam ser vistos nos clubes, para o centro expandido da cidade, em festas que reuniram até 15 mil pessoas. Era lindo! Era democrático! Mas o prefeito mudou, a secretaria foi extinta, pronto… acabou.

Desde que trabalho na noite (1997), sempre fomos vilões. Não tem jeito. A noite já foi mais libertária, mais romântica talvez… era fácil ser underground. Você abria um lugar, sem documentação, sem seguir muitas regras, sem pagar impostos, era lacrado, abria no peito, tinha patrocínio correndo solto. Isso mudou. Totalmente. Isso obrigou quem ficou no mercado a se organizar, se profissionalizar. Hoje em dia tem regras, tem que trabalhar direito, os patrocínios acabaram, o dinheiro ficou muito mais escasso. Mas, por mais que a gente faça, tá sempre tomando porrada. A gente continua sendo vilão. A noite só tem “drogado”, “bêbado” e “putaria”. Basicamente, para a opinião pública, é assim que somos vistos.

Flávia: “Acho que tem gente muito séria fazendo festas”

Depois da tragédia na boate Kiss, fomos chamados pela Prefeitura (gestão Haddad) para uma conversa. Rolou a promessa de uma “secretaria de licenciamentos”, desde que seguíssemos as questões de segurança exigidas, teríamos a liberação de alvarás de funcionamento em três meses!!! Isso NUNCA aconteceu e, depois daquela reunião, nunca mais houve um canal de comunicação.

O problema é que a noite sempre foi muito desunida. A gente sempre se viu como concorrentes e agiu por conta própria, cada um resolvendo os seus problemas, do seu lado. Até que, ano passado, as regras mudaram no meio do jogo (novas leis!) e a gente se viu desamparado e fodido. Ou a gente se unia, juntava forças, ou sei lá…

Foi aí que decidimos criar uma associação, a ABCNESP, para reunir dados, mostrar para a sociedade que geramos empregos, que movimentamos a economia, que estamos seguindo as regras e merecemos ser respeitados. A associação tá engatinhando. Fomos chamando uns aos outros, mas faltam muuuuuitos ainda, sabemos disso.

Em 23/03/2016 um novo decreto foi sancionado. Dois dias depois, sem que a gente soubesse dessa mudança, começaram as fiscalizações e obviamente as autuações. Não conheço quem não tenha sido autuado.

Basicamente, a nova lei diz que “estabelecimentos que comercializarem bebida alcoólica e que funcionarem com portas, janelas, ou quaisquer vãos abertos, ou ainda que utilizarem terraços, varandas ou espaços assemelhados… não poderão funcionar entre 1h e 5h”.
” A fiscalização da infração independe da medição por sonômetro”.
” Conjuntamente com a imposição das multas o agente municipal intimará o infrator para tomar as medidas necessárias para cessar de imediato a irregularidade, podendo ser determinado o esvaziamento do local.”
” Considera-se prejudicial ao sossego público a presença de pessoas que, ainda que, estejam fora do estabelecimento, sejam por ele servidos, atendidos, ou estejam de qualquer forma a ele relacionados, gerando incomodidade.”

Peraí que é difícil até começar.
Então agora não pode ter varanda? Mas até ontem podia! Problema seu.

Mas não posso ter vão aberto? Mas eu tenho antecâmara, tenho portas acústicas, tratamento na casa toda, as pessoas vão sair por onde? Problema seu.

E a lei do cigarro? A lei do cigarro me obrigou a colocar as pessoas em locais abertos! Problema seu.
E eu sou responsável pelo cara que chega na minha fila horas antes da casa abrir e fica bebendo (de ambulante!!!) com a turma? É.
Mas e o cara que passa na rua com o som no talo, cantando pneu? E na Augusta onde uma coisa é colada na outra, quem é responsável por quem? Adivinha!

Com o plus de que o fiscal pode decidir, por critério subjetivo (antes era usado o decibelímetro) que você está “causando incomodidade” e não só lhe dar uma multa como parar o som e colocar seus clientes pra fora.

Além disso, somos colocados todos no mesmo saco… o bar, o bar com pista, o clube, o evento, o festival. Cada um tem as suas peculiaridades e precisam seguir regras distintas.

O Lov.e Por SP foi um projeto do clube que levou DJs pra tocar de graça pela cidade

Acho que tem gente muito séria fazendo festas. Gente que eu respeito pencas. Gente que entende o tamanho da responsabilidade, porque cara… você tá ali colocando o seu na reta, responsável pela segurança de muita gente.

Mas acho que também existe quem não esteja nem aí, se aproveitando de um momento, batendo no peito e se dizendo underground. Fazendo festas em lugares sem a menor condição. Eu sei, eu vejo.
Entendo, mas me preocupa.

Primeiro acho que as regras devem servir pra todo mundo, as mesmas leis que eu devo obedecer, as festas também devem. Porque se uma hora der uma merda numa festa dessas sem estrutura, quem vai pagar o pato é “a noite”. É quem tá legalizado… os vilões de sempre.
Acho incrível que as pessoas tenham a opção de escolher o que querem ouvir, como e onde querem se divertir e espero que elas façam isso porque na festa o line-up vai ser foda, ou porque a estrutura da festa ou o local, ou o público são incríveis. Não apenas pelo caráter subversivo.

É como eu disse antes, a gente precisava se unir. Só unidos conseguiremos alguma coisa. Precisamos mudar uma lei!!! Mudar lei não é fácil. Não dá para mudar pra um, é mudar para todos. Todos se beneficiarão. Os bares, os clubes, as festas, os festivais. Dentro da associação temos direções diferentes, públicos distintos e precisamos abranger muito mais. São Paulo sempre teve uma noite tão foda. Isso está super-ameaçado.
Com a ABCNESP conseguimos depois de muitos anos, ser ouvidos pelo poder público, estamos avançando. Veja bem, independente de inclinação política pessoal de cada um, estamos lutando pelos interesses de todos. É isso ou sentar e esperar ser fechado.

Entendo que a polêmica é muito mais interessante do que a realidade. O cancelamento da ODD deu margem para teorias da conspiração… nós, os empresários da noite… o grupinho do mal… buuuuuuu. Não é hora pra mimimi ou conflitos pessoais. Nossos problemas são muito maiores. Talvez essa polêmica tenha sido boa pra gente se unir de vez, todos.

RESISTÊNCIA VAMPIRESCA NO CENTRÃO

A Vampire Haus nasceu em 2014 e passou a fazer festas na Praça Ramos, de graça, no ano seguinte, e é lá que querem ficar

SUZANA HADDAD, do Casal Belalugosi, DJ e uma das criadoras do núcleo VAMPIRE HAUS

O que acontece no rolê da rua é que com a gestão Haddad, a gente pegava uma autorização de uso de solo na Subprefeitura da Sé de um jeito bem fácil. A gente mandava um email com um formulário preenchido e a galera lá já conhecia a gente, tinha bons olhos quanto à Vampire. De janeiro de 2015 até novembro de 2016, fazendo Vampire Haus de graça na Praça Ramos em frente ao Teatro Municipal, mês sim, mês não, era bem tranquilo. A gente conseguia autorização em uma semana, eles exigiam alguns cuidados, como por exemplo colocar os banheiros químicos, protocolar documento junto à GCM (Guarda Civil Metropolitana) e a Polícia Militar, além de limpar a praça depois e se comprometer a preservar o local e evitar pixação.

Suzana Haddad e Loki: Casa Belalugosi

 

Agora o que acontece é: você tem que imprimir um formulário no site da Subprefeitura da Sé, no nosso caso, porque queremos continuar fazendo lá na Praça Ramos, e aí você tem que passar no Centro de Atendimento que fica do lado da Subprefeitura da Sé, dar entrada no protocolo, pagar uma taxa, e aí eles mandam isso pra SubSé, a SubSé manda pra outro órgão, que avalia que documentos você precisa e esse pedido precisa dar entrada 30 dias antes do evento. Daí a SubSé manda você pra um outro órgão, que é o SEGUR, que é o órgão dos engenheiros especialistas, e que dão o parecer final. Daí a SEGUR pode exigir que você tenha ambulância, segurança, enfermeiro, bombeiro, é uma loucura pra quem fazer um evento como o nosso, que é de graça e totalmente independente. Daí o SEGUR tem que mandar um email de volta pra SubSé falando que eles não têm nenhum impedimento para que o evento aconteça e estabelecendo as exigências. A SubSé depois disso tem que repassar tudo de novo solicitando o aval do primeiro órgão fiscalizador sem ter autonomia de avaliar sozinha. É uma puta burocracia. No nosso caso esse procedimento era pra ser bem simples, já que não temos palco, não vendemos nada, não temos marca por trás.

É um encontro grandioso porém bem rústico, caixas, mesa e só. Temos uma data que é dia 1 de julho na Praça e se a gente não ganhar a autorização a gente vai fazer um ato com trio elétrico e vai parar na Praça Ramos do mesmo jeito, porque se entra como ato aí é um direito dentro da legalidade, igual o pessoal da Mamba fez mês passado usando outro trajeto. Vai ser resistência clubber até o final. Mas eu acredito que este alvará pode sair sim e se ele sair será um marco bem importante pra abrirmos caminho e encorajar mais festas a solicitarem a autorização e a rolarem na rua legalmente.

Nessa nova gestão não soube de nenhuma festa feita na rua que tenha conseguido esse alvará de ocupação de espaço público até agora. A gente fez o bloco de Carnaval mas aí foi a Prefeitura que cuidou das autorizações pra todos os blocos. E fizemos duas festas em abril usando a lei do artista de rua, na Praça da República, o que foi bem ousado. Mas nas duas ocasiões a GCM ameaçou parar a festa do início ao fim por várias denúncias de vizinhos. Usando apenas a lei do artista de rua com certeza não vai dar mais pra fazer. Agora precisamos mesmo ter alvará. A festa tá enorme, e as expectativas do nosso público também. Não podemos correr o risco de a Polícia ir lá e parar no meio. A merda de não ter o alvará é que às vezes a GCM nem deixa você instalar as caixas enquanto você não mostrar o papel, e pode até apreender os equipamentos. Mas não vai ser o alvará que vai fazer a gente parar de fazer a festa. Agora com o Dória ficou muito mais burocrático, mas estamos otimistas que iremos conseguir. Antes era assim: a gente olhava o calendário e se não tivesse festa nenhuma no fim de semana, a gente fazia, porque o alvará saia em uma semana. Mas se agora o alvará não sair, a gente vai partir pra ato, ou fazer em lugares que saiam da alçada da Prefeitura e entram na alçada de Secretaria de Cultura, Governo do Estado, ou seja o que for. Vamos ter que ter paciência, dialogar com a nova gestão, ou mesmo encontrar novos caminhos. Isso exige da gente uma criatividade cada vez maior pra burlar a burocracia e fazer de qualquer forma. É uma merda porque esta autorização que a gente tinha na rua é resultado de um trabalho de anos que as festas independentes vieram fazendo, ganhando o reconhecimento da gestão anterior e conquistando seu espaço. Estamos agora vivendo um retrocesso. Mas nada vai nos parar, o público e a cidade estão do nosso lado. Keep FIRE, keep UNDEAD :)))))

TANTSA FOI EM BUSCA DE ALVARÁ JÁ NA TERCEIRA EDIÇÃO

A Tantsa nasceu em setembro de 2016 e fez quatro festas até agora, as duas mais recentes com alvarás de funcionamento

MARCELO MADUEÑO, idealizador da festa TANTSA (junto com Victor Senedesi)

Nossas duas primeiras festas não tiveram alvará. E isso causou atrito demais, polícia chegando à festa e até parando mais cedo. As duas ultimas nós já buscamos regularizar tudo. Alvará, ambulância, extintores de incêndio, seguro de RC e AP. até fizemos uma campanha de silêncio porque haviam prédios residenciais ao redor.

Marcelo Madueño, um dos criadores da Tantsa

Não foi fácil no entanto! São poucos os lugares que conseguem cooptar uma cenografia legal com a possibilidade de tirar um alvará. Acho que assim como existe uma flexibilização tributária para pequenas empresas, deveria existir uma forma menos burocrática e mais barata para assegurar que o fomento à cultura alternativa siga a padrões aceitáveis de segurança. Nosso público está em uma crescente. A primeira festa teve 500 pessoas, a última 1.100. Eu gosto de toda a ideia de ocupação de espaços tombados, fábricas abandonadas, pé direto alto, mas sinceramente gostaria de algo open air. A maior dificuldade é não incomodar as proximidades e o clima doido de São Paulo. Já passamos pela Funilaria, pelo Warehouse e agora estamos na antiga Indústria Minetti Gamba, que fazia parte do complexo de fábricas do Moinho Santo Antônio.

 

 

Claudia Assef

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Autora do único livro escrito no Brasil sobre a história do DJ e da cena eletrônica nacional, a jornalista e DJ Claudia Assef tomou contato com a música de pista ainda criança, por influência dos pais, um casal festeiro que não perdia noitadas nas discotecas que fervilhavam na São Paulo dos anos 70.

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