Adrian Belew, gênio que tocou com Talking Heads, promove culto da guitarra em SP
Admito que não entendi muito bem o motivo de um dos deuses da vanguarda da guitarra vir tocar em São Paulo num pico como o Carioca Club, onde o line-up tende a receber ídolos do pagode e do funk. Mas quem se importa, afinal, sábado (26) era noite de pedir benção ao gênio da guitarra Adrian Belew, e eu não estava sozinho nesse culto.
O público era composto por homens (em sua grande maioria) acima de 40 anos, talvez eu fosse o mais novo ali. Acho que uns 30% do público usava camisetas do King Crimson, grande banda expoente do rock experimental nos anos 70 e na qual Adrian Belew começou a se destacar como gênio. Dava pra ver alguns jovens adultos que, assim como eu, estavam lá para presenciar algo que poderiam contar para seus netos, “moleque, eu já vi o Adrian Belew no palco”.
O show se dividiu em duas partes de uma hora. Cheguei na segunda metade porque estava zicando o Palmeiras para não ser campeão brasileiro (não deu certo). Assim que me posicionei na pista, o Adrian apareceu pulando no palco como se tivesse trinta e poucos anos num show do Talking Heads na época do disco Remain in Light. Adrian Belew ajudou David Byrne e companhia e Brian Eno a fazer e excursionar o Remain in Light. Adrian Belew conseguiu implementar seus sons esquisitos na perfeita fusão de música africana com o pós-punk do Talking Heads, criando um dos maiores álbuns de todos os tempos. Entenda melhor do que estou falando vendo este show da turnê gravador em Roma.
Talking Heads Live in Rome
Assim que o primeiro acorde ressoou, deu pra ver a destreza do Adrian com o instrumento. Realmente, é bizarro vê-lo tocando guitarra. Todos que viram Jimi Hendrix tocando guitarra dizem que o instrumento parecia uma extensão do seu corpo e que todos os movimentos eram muito naturais. Eu vi algo parecido com isso na noite do sábado, no palco do Carioca Club.
A guitarra nada mais é do que uma parte do corpo do Adrian, que toca fazendo caretas, pulando e se chacoalhando aos 66 anos de idade. Outra coisa que me deixou espantado foi a velocidade com a qual ele executa riffs nota 11 numa escala de dificuldade de 0-10 sem errar uma nota sequer. Aliás, ele deve errar algumas notas. Mas acho que a grande regra para esses gênios da música é abraçar o erro. O erro faz parte da música e a torna humana.
Hoje em dia Adrian toca músicas de sua carreira com um power trio de qualidade, composto por uma baixista e um baterista. Ambos tocam demais. Porém, você mal os vê no palco porque ambos são engolidos pelos timbres esquisitos e solos devastadores do guitarrista. Ele canta muito também! Tem um timbre de voz muito único, que casa perfeitamente com a sua arte experimental. Não é nem preciso dizer que as músicas do King Crimson foram as mais ovacionadas e gritos de “gênio”e “mágico” eram ouvidos constantemente.