Jeff Mills Foto: Reprodução

Herdeiro do Kraftwerk, Jeff Mills lança “ópera cósmica” unindo música e ciência

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Conceitual, cinemático e experimental, o projeto THE TRIP – ENTER THE BLACK HOLE já nasce como uma obra-prima

Há tempos que Jeff Mills se cansou de fazer techno como interpretação da fuligem e dos barulhos das grandes cidades, principal inspiração do gênero musical que ajudou a consolidar. Desde 2017, quando veio com o disco Lost In Space, o DJ e produtor americano fixou residência no espaço sideral.

Lançado nesta quarta-feira (20), THE TRIP – ENTER THE BLACK HOLE é mais um de seus diários de viagens galácticas. O álbum é parte de um projeto que inclui um show audiovisual que terá projeções, iluminação e dança contemporânea, com estreia marcada para dia 1º de abril em Tóquio, no Japão.

O produtor se uniu à vocalista Jun Togawa, ao tecladista fissurado em sintetizadores Shinichi Yamaguchi e ao guitarrista Kazuhide Yamaji para acompanhá-lo nas composições. O projeto visual da nova “ópera cósmica” de Mills ficou por conta do estúdio japonês Cosmic Lab.

Musicalmente (a parte do projeto que tivemos acesso hoje), o álbum é primoroso. A trilha sonora de uma viagem para dentro de um buraco negro. O disco inclui sons gravados pela NASA em 2022, vindos diretamente do espaço, e modificados de forma a se tornarem audíveis ao ouvido humano.

Mills joga em casa. No ano passado, reescreveu a trilha sonora para o clássico filme de ficção científica Metrópolis, de Fritz Lang, originalmente lançado em 1927. É doido pelo assunto e encontrou, no espaço, o futuro de sua música.

A esperada apresentação do LP vai rolar na casa Zero Tokyo, e é anunciada como algo totalmente imersivo.

THE TRIP tem 12 faixas capazes de deixar Stanley Kubrick de queixo caído. Conceitual, cinemático e totalmente experimental, o álbum já nasce como uma obra-prima, e vai reverberar ainda mais com o lançamento do show.

A manutenção da música eletrônica como um organismo vivo e extraterreno coloca Mills na posição de principal herdeiro da revolução proposta pelo Kraftwerk, a partir dos anos 70: a vertente como uma criadora de paisagens e metaversos, capazes de transformar a audição musical em algo maior, como propôs John Cage lá atrás, com seus estudos sobre música ambiente.

Enquanto o quarteto alemão ainda excursiona pelo mundo tocando seus maiores sucessos da carreira em shows apuradíssimos, o DJ e produtor de Detroit segue dando passos além, criando música ainda não ouvida, tecnicamente revolucionária, e provocando experiências que unem ciência e espiritualidade.

Jeff Mills, definitivamente, não é mais deste mundo.

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.