A gente sabe que o techno nunca saiu da boate, mas que ele tá na moda, isso tá (feat. Camilo, Cohen, Noise e Mau²)

Jade Gola
Por Jade Gola

O techno esteve na boca do povo esta semana, com a notícia de que o gênero passou a ser o mais vendido do Beatport em 2016. O dado foi revelado em um documento apresentado na International Music Summit – Ibiza 2016, que rolou no fim de maio. Assim como o Beatport, a cena de Ibiza consegue ser um personagem delimitador dos rótulos de uma música que, paradoxalmente, foge de muitos rótulos.

Mas entre os rótulos que aí estão, o techno é dos mais bradados orgulhosamente por DJs e clubbers, e as reações ao fato foram efusivas aqui no Brasil, terra de ligação já bem forte e histórica com o gênero. DJs, produtores e promoters reforçaram como o techno nunca saiu da cena – não saiu “nem pra fumar um cigarro”, como brincou Wehbba, outro nome de techno, ao participar de um post sobre o assunto do DJ e jornalista Camilo Rocha, que teve mais de 300 emocionados compartilhamentos celebrando (e ironizando) a tal volta de um som que nunca foi embora…

O retorno do techno como best-seller, e como gênero cada vez mais pedido e dançado, tem sido bem comprovado na cidade do Camilo, São Paulo, onde clubes como Clash e D-Edge, e festas proeminentes como Carlos Capslock, Mamba Negra, Vampire House, Subdivisions, ODD, Düsk, Dsviant, Metanol e Techno Route, entre outras, lotam pistas com o tratorzão mecânico e envolvente do techno.

  • VAMOS AO GRÁFICO: o techno vem superando há mais de ano a deep house, som que tocou demais e virou alvo de muita chacota pelos excessos de seu low-bpm ketaminado; mas a house music, em sua ideia geral, segue numa linha estável de vendas pelo cânone que é; o drum’n’bass também registrou notável ascensão na loja; o trance minguou, talvez substituído pela EDM como o som das multidões? (aliás, não há EDM como categoria no Beatport, talvez por esta também ter se tornado uma categoria pejorativa, apesar de seu sucesso, quase um palavrão na autenticidade da dance music).

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  COHEN-NOISE-MAU EXPLICAM (E CELEBRAM) A NOVA FORÇA DO TECHNO

Camilo Rocha matou o assunto a pau em seu inspiradíssimo post, conceituando bem como “enquanto houver gente procurando extrair grooves de máquinas, buscando uma alegoria rítmica para o nosso cenário urbano pós-industrial, se deliciando com fortes emoções sintéticas, haverá techno.”

Fomos checar também essa história de techno is back com outros três figurões do gênero, Renato Cohen, Anderson Noise e Mau Mau, que têm tocado (techno) juntos e foram entrevistados pela gente recentemente.

Para o mineiro Anderson Noise, esse novo destaque ao techno “é o retrato da quantidade de excelentes artistas que temos hoje espalhados pelo mundo produzindo e tocando techno”. Pensando em tracks ótimas saindo do forno, ele espera, otimista, “que tudo de bom que está acontecendo com o techno hoje se reflita aqui no Brasil, com mais gente produzindo bom techno por aqui”.

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Cohen foi herói brasileiro no techno mundial da década passada, fez uma deliciosa transição para disco music (que eu busquei mapear nessa entrevista pro rraurl em 2010) e até hoje toca (e toca bem) de tudo, inclusive muito techno, é claro. Há tempos Cohen notou como o “techno está voltando”, e que esse retorno significa que muita coisa que virá por aí release-wise será rotulada como techno nas lojas.

“Qualquer que seja o ‘nome da moda’, as lojas vão classificar todos seus lançamentos por esse nome. Há cinco anos, qualquer coisa era disco ou  nu disco na Beatport. Em 2005, a moda era minimal e electrohouse, qualquer disco de techno da época ia ser um dos dois, se fosse pesado era eletrohouse, se fosse mais leve era minimal. Tudo nessa loja é baseado em vendas, não em música”, diz o DJ, que diz achar a Beatport uma loja ruim.

“Mesmo na época do vinil as lojas faziam isto: o estilo que estivesse em alta elas categorizavam todos os discos dentro daquele rótulo” – COHEN

“Apesar de tudo isso parecer uma bobagem”, segue Cohen em seu raciocínio e com exemplos, “o techno nunca foi embora. Mas ultimamente realmente voltou com força. o Robert Hood toca hoje no Room 1 do Fabric. E o Fabric sempre me colocou no Room 2 porque eu era techno”.

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“Techno! The New Dance Sound Of Detroit”: a coletânea lançada em 88 no Reino Unido pela 10 Records foi um documento fonográfico pioneiro e importante, de sucesso global (tinha o hit Big Fun, do Inner City), a carimbar o termo TECHNO e a desenhar bem a relação conceitual (e carnal) desse subgênero com Detroit. Camilo Rocha relembrou do disco na sua bonita cronologia pessoal do techno no Brasil. (Discogs)

Mau Mau, outro grande ícone do techno brasileiro, disse que de fato o pessoal está pedindo pra ele tocar mais techno hoje em dia, “até em lugares mais inusitados onde antes me pediam deep house. Queriam sempre qualquer gênero mais lento, menos agressivo, que era deep house”.

O sempre simpático Maurício ao quadrado diverte-se ao comentar mais esse frenesi em torno do “estado das coisas” dos gêneros da eletrônica. “Sempre tem essa necessidade de colocar o gênero do momento, da moda, que as pessoas seguem aquilo como se fosse a coisa mais importante do mundo. Eu sempre misturei os gêneros e nunca me importei muito com isso”, diz. “Para mim o diferencial são bons timbres, boas tracks. E eu sempre toquei techno e house”.

Assim como Cohen, Mau Mau não passa muito o cartão na Beatport. “Dá muito mais trabalho pesquisar lá do que em outros lugares. O Beatport é democrático, todo mundo bota música, tem muita coisa. Nem tudo é do meu agrado, então demora muito pesquisar lá” – é de se imaginar o tanto de coisa que surgirá no Beaport como techno agora, na esteira do que Cohen comentou. E Mau finaliza dando a receita de como abastece seus cases e playlists: “compro bastante na Juno ainda, pesquiso mais as lojas que eu já sei que gosto e também lançamentos dos selos e artistas que me agradam”.

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