Juan Atkins Juan Atkins no C6 Fest 2023. Foto: Tati Silvestroni/Music Non Stop

Atração do DGTL São Paulo, Juan Atkins traduziu a essência de James Brown ao techno

Jota Wagner
Por Jota Wagner

Por maior que tenha sido sua criação e influência no gênero, Atkins é bem mais estranho à nova geração do que deveria

Dia 16 de novembro, o festival DGTL trará ao Brasil mais um pioneiro do techno, Juan Atkins. Original de Detroit, o homem não só estava lá quando tudo começou, como foi o responsável por arrastar outros dois mestres, Derrick May e Kevin Saunderson, para a nova música que estava criando.

Por maior que tenha sido sua criação e influência no mundo do techno, Atkins é bem mais estranho à nova geração dos frequentadores de festivais de música eletrônica do que deveria. E sacadas como essa, do DGTL, ajudam a reparar tal buraco histórico. Afinal, o DJ representa não só um capítulo obrigatório em qualquer cartilha do gênero, como também nos lembra sobre as verdadeiras raízes sociais da cultura eletrônica.

Hoje, após décadas de massificação, transformações e, infelizmente, gentrificação, a molecada muitas vezes passa desavisada sobre a importância social e artística de um tipo de música que parece ter estado sempre na mãos de jovens brancos da classe média alta. Não poderia estar mais distante da história.

Juan Atkins cresceu na periferia pobre e violenta de Detroit. Seu pai, traficante de drogas, cumpre prisão perpétua por ter assassinado um cara que dava em cima de sua mãe. Foi nesse ambiente que cresceu o futuro criador do techno, sob a trilha sonora de James Brown e Parliament Funkadelic.

No Ufo’s, de Juan Atkins (assinando como Model 500), é uma das músicas fundamentais da história do techno

Um dos capítulos mais interessantes da vida do grande nome do soul, James Brown, é o tratamento que dava aos instrumentos. Quando um novo músico entrava no seleto hall de contratados de Brown, ele sempre os perguntava: “que instrumento você toca?”. Não importa qual fosse a resposta, baixo, saxofone, trumpete, piano, Brown sempre os corrigia. “Não, aqui você toca percussão”. O mestre do soul queria que todo mundo pensasse no ritmo ao tocar o groove como uma bateria, independentemente do timbre. Mal sabia o cara que estava ajudando a inventar o techno.

O gênero, como bem dizia o produtor brasileiro Dudu Marote em conversas de bar, era um “estudo do groove”. Construído basicamente sobre um alicerce de baterias e percussões eletrônicas, tudo no techno é pensado a favor do ritmo. Juan Atkins, portanto, fez a ponte entre a forma de pensar de James Brown e o gênero musical eletrônico como hoje o conhecemos. Mais genial, impossível.

O artista de Detroit entrou definitivamente nas experimentações após ganhar um sintetizador da avó. Juntando a mente percussiva que tinha como referência musical, cunhou o techno em uma excelente coleção de dezenas de singles, EPs e álbuns a partir de 1985. Em 2017, lançou o seu último álbum de estúdio até então, Mind Merge.

Não é a primeira vez que Juan Atkins vem desfilar sua elegância no Brasil. A primeira visita do DJ foi em 2000, na época das “megaraves”. Ouvi-lo, no entanto, é garantia de prazer. E apresentar-se para mais uma geração que frequenta as festas de música eletrônica brasileira é imprescindível.

O DGTL São Paulo ainda contará com os gringos The Blessed Madonna (EUA), Jeff Mills (EUA), Sara Landry (EUA), DVS1 (EUA), Eelke Kleijn (Holanda), Héctor Oaks (Espanha), AnD (Inglaterra), MCR-T (Alemanha), Sommiac One (Lituânia), Souldynamic (Itália) e Cinthie (Alemanha); e os brasileiros Albuquerque, Beto Chuquer, Ed Lopes, Eli Iwasa, From House to Disco, Julia Weck, Lycra Preta, Marcal, Marcio S, Mary Mesk, Mayra Maldjian, Milton Chuquer, PETDuo, Tessuto e Vitorino.

A localização do festival ainda não foi divulgada. Os ingressos começam a ser comercializados na próxima segunda-feira, 26.

 

Jota Wagner

Jota Wagner escreve, discoteca e faz festas no Brasil e Europa desde o começo da década de 90. Atualmente é repórter especial de cultura no Music Non Stop e produtor cultural na Agência 55. Contribuiu, usando os ouvidos, os pés ou as mãos, com a aurora da música eletrônica brasileira.