Três noites lotadas reviveram o marco de 2005 com shows históricos de Wander Wildner, Bidê ou Balde, Ultramen e Cachorro Grande
Por Bruna Medina
Em um final de semana que celebrou em Porto Alegre os 20 anos da realização do Acústico MTV Bandas Gaúchas, de 2005, quatro grandes bandas do Estado se reuniram novamente depois de altos e baixos entre os integrantes de cada um dos grupos. Com três noites (sexta, 19, apenas para colaboradores do banco Banrisul; e sábado, 20, e domingo, 21, para o público geral) lotadas no Auditório Araújo Vianna, que tem capacidade para mais de quatro mil pessoas — além de alcançar mais de cinco mil fãs através da transmissão ao vivo no YouTube —, o evento foi uma grande homenagem ao gênero tão amado e apreciado nacionalmente, o rock gaúcho.
O repertório contemplou as 20 músicas originais do DVD gravado na época (cinco de cada grupo), e cada atração teve mais cinco adições no setlist, o que tornou a celebração um grande festival nostálgico com, aproximadamente, seis horas de duração por noite.
Wander Wildner abriu os trabalhos com seus maiores sucessos: Eu não consigo ser alegre o tempo inteiro, Bebendo Vinho e Eu Tenho uma Camiseta Escrita Eu Te Amo, mas com adaptações nas letras originais que se encaixam mais no atual status de vida do cantor: “canções iluminadas de amor”, diz o artista em determinado momento.
Já na segunda metade, Wildner apresentou seu mais recente trabalho, em que fez versões de outros artistas já conhecidos do grande público: Secos & Molhados, Caetano Veloso e versões em português de Redemption Song (Bob Marley) e The Killing Moon (Echo & The Bunnymen). Com um formato bem próximo do original apresentado há 20 anos, três violões, um baixolão, bateria, piano e gaita (ou acordeon) acompanharam o cantor nos hits e novidades interessantes para um público que curtiu de maneira mais tímida a primeira apresentação.
Wander Wildner. Foto: Caio Mincarone
Em seguida, Carlinhos Carneiro e Rodrigo Pilla, membros originais da finada Bidê ou Balde, trouxeram toda a energia de antigamente, e o frontman comunicativo não deixou o público desanimar. Além de interações constantes, Carlinhos surpreendeu a plateia ao tocar com a filha pequena no colo, e, no sábado, ainda pediu a mão de sua companheira em casamento, assim como para o pai da moça, que estava presente naquela noite (no domingo, o slot “proposta de casamento” foi preenchido por um casal de fãs no mesmo momento do show anterior).
Com todos os sucessos presentes, a troca de energia foi enorme, e ninguém ficou parado durante a uma hora de apresentação. Na faixa Fazer Tudo a Pé, Pilla liderou os vocais e mostrou que a Bidê ou Balde nunca deixou de ocupar um espaço importante no coração dos fãs das antigas (e de seus integrantes), deixando o momento mais intimista com luzes apagadas e apenas os flashes dos celulares iluminando o palco.
Em Mesma Cidade, o vocalista transformou o significado da música para os gaúchos após o período de enchentes de 2024. Melissa contou com participação de Rafael Malenotti, da Acústicos & Valvulados, que Carneiro fez questão de pontuar que era uma reparação histórica por não terem sido convidados para o Acústico na época; e Bromélias e Lucinha levantaram o público saudoso pelos grandes hits que marcaram época. Mesmo Que Mude encerrou com chave de ouro e muita emoção a homenagem a essa grande banda que foi a Bidê.
Bidê ou Balde. Foto: Caio Mincarone
A surpresa da noite para essa forasteira paulista aqui foi a banda Ultramen. De todos os grupos, o som desta é o que mais se distancia do rock gaúcho, com influências do reggae e do rap, trazendo elementos diferenciados que se juntam a um quê de brasilidade. O show iniciou com a clássica Ultramanos, e ainda na primeira metade, apresentaram uma nova canção do próximo álbum, Na Crista da Onda.
Em Dívida, seu maior hit, incluíram um remix de I Want You Back, do Jackson 5, e até se reuniram em “formato boyband” em torno do microfone, com coreografia ensaiada, deixando a noite ainda mais descontraída. Estiveram presentes uma versão de Grama Verde, da banda dos anos 1970 Pau Brasil, a introdução da música infantil Baby Shark no início de Tubarãozinho, e o encerramento deu-se com Amigo Punk, cover do clássico dos amigos da Graforréia Xilarmônica. A Ultramen fez um show memorável e animadíssimo, que terminou com o público pedindo bis (infelizmente não atendido, visto o formato de dez músicas por banda).
O encerramento ficou por conta da Cachorro Grande, a banda queridinha da MTV que, na época do Acústico, era recente, com apenas dois álbuns lançados — e o seu maior sucesso não havia sido composto ainda. De volta na estrada desde 2024 após um hiato de seis anos, com a maior parte de sua formação original comemorando os 25 anos do grupo, a execução de seus grandes hits está afiadíssima, e abrir com Sexperienced executada como a versão do DVD de 2005, foi uma surpresa agradável. A primeira parte seguiu na mesma ordem da época, com Hey Amigo (em que Malenotti reapareceu no palco para cantar junto de Beto Bruno, surpreendendo até o próprio cantor), Que Loucura e O Dia de Amanhã.
Ultramen. Foto: Caio Mincarone
Debaixo do Meu Chapéu, primeira composição da Cachorro, não poderia ficar de fora, enquanto Bom Brasileiro e Lili vieram para completar o set de hits amados e entoados a plenos pulmões pela plateia.
Em Dia Perfeito, com Marcelo Gross assumindo os vocais, vimos um dueto no piano de Pedro Pelotas dividindo as teclas com Mari Kerber, que acompanha os “Big Dogs” quando Pelotas não tem agenda (hoje, ele é integrante da banda de Samuel Rosa). A performance não ensaiada foi surpreendente, e se transformou numa jam animadíssima que se estendeu por uns minutinhos a mais, levando o público ao êxtase em ver músicos grandiosos se divertindo e fazendo o que sabem de melhor.
O sucesso maior, Sinceramente, sempre emociona, e transforma a atmosfera do local com os espectadores agitando suas lanternas ao longo da balada mais romântica da turma — um momento mais calmo que foi completamente tomado pela energia da música seguinte, Você Não Sabe o Que Perdeu, em que Beto “não aguentava mais o violão” e Gross surgiu com sua guitarra potente. Assim, a terceira noite foi encerrada com uma energia surreal, enquanto todos os outros integrantes ficaram em torno da percussão, fazendo mais uma jam em um show que não teve nem uma hora de duração, mas que parecia ter levado uma noite toda, de tanta entrega e troca.
Cachorro Grande. Foto: Caio Mincarone
Obs.: Nenhum instrumento foi machucado na noite três, diferentemente da noite dois, quando um violão não resistiu e acabou sendo estraçalhado pelas mãos do guitarrista.